A carta surgiu logo após as eleições autárquicas de outubro de 2023, marcadas por alegações de fraude, protestos violentos e repressão policial. Esse cenário foi criticado pelo Indivíduo A, que alertou para o impacto negativo dessas práticas na confiança popular. Ele escreveu:
“Não era preferível ter trabalhado bem para conquistar as mentes e os corações dos moçambicanos do que enveredar pela montagem de teatros do tamanho do mundo para hoje recorrer a martelanços de resultados de eleições autárquicas?”
Essa questão retórica revela a insatisfação do autor com a estratégia política que, segundo ele, prioriza o controle do poder em detrimento do respeito pela soberania popular. Em comparação, o autor rememora períodos em que o partido no poder agia com maior alinhamento aos princípios democráticos, destacando como exemplo a decisão de Armando Guebuza de aceitar resultados eleitorais desfavoráveis em 2011 a favor de Manuel de Araújo na autarquia de Quelimane.
Em contraste, as eleições de 2023 aprofundaram o fosso entre o governo e a população, com protestos que culminaram em repressão e perda de vidas. Para António Carlos do Rosário, essa abordagem é uma falha estratégica e moral que ameaça a estabilidade nacional.
Segurança nacional como pilar negligenciado
Um dos pilares da carta é a segurança nacional, que o autor apresenta como um elemento essencial para a paz e o desenvolvimento do país. Ele defende que a segurança não é algo produzido por instituições isoladas, mas um reflexo da confiança e colaboração entre o governo e os cidadãos. Ele observa:
“A segurança é produzida pelos milhões de moçambicanos que habitam o território nacional.”
No entanto, os eventos de 2024 indicam que esse princípio tem sido desrespeitado. A repressão contínua aos protestos e as greves em sectores essenciais além dos cidadãos comuns, como educação e saúde, são sinais de uma relação deteriorada entre o Estado e a população. Em vez de fortalecer os laços sociais, o governo parece estar aprofundando as divisões.
A carta do indivíduo A, faz várias referências a períodos anteriores, especialmente os mandatos de Joaquim Chissano e Armando Guebuza, como exemplos de liderança mais conectada à população. O autor destaca que, apesar dos desafios enfrentados por esses líderes, eles buscaram governar com maior respeito às normas democráticas. Ele pergunta:
“Por que temos dificuldade em seguir o exemplo dos sábios Presidentes Chissano e Guebuza?”
Essa comparação é ainda mais relevante quando se analisa o actual contexto de Moçambique. Em 2024, as greves e protestos tornaram-se mais frequentes, reflectindo a insatisfação com políticas governamentais que ignoram as demandas populares. Em vez de um diálogo construtivo, a resposta tem sido muitas vezes a repressão e assassinato dos manifestantes liderados por Venâncio Mondlane, aprofundando o sentimento de injustiça.
O apelo à liderança ética
Um dos trechos mais impactantes da carta é o apelo do autor para que o Presidente Filipe Nyusi considere o impacto de suas acções e, se necessário, renuncie em prol do bem maior do país. Ele escreve:
“Não permita que manchem o seu último ano de mandato. É melhor colocar o seu lugar à disposição do que tentar travar o vento com as mãos.”
Portanto, ressaltando a importância de uma liderança ética e responsável, especialmente em tempos de crise como o actual. Em 2024, com um ciclo eleitoral conturbado, com manifestações por todo canto, quase todos os dias, essa reflexão ganha ainda mais relevância. A falta de confiança nas instituições eleitorais e o descontentamento generalizado podem ameaçar não apenas a estabilidade política, mas também o progresso social e econômico do país.
Um ano após a publicação da carta, as questões levantadas por Indivíduo A permanecem tão relevantes quanto no momento em que foram escritas. Elas servem como um alerta para o governo moçambicano: sem a reconciliação com o povo e sem uma governação mais inclusiva e ética, os desafios do país continuarão a se agravar.
O apelo pela paz, unidade e desenvolvimento, fundamentado em uma segurança verdadeiramente nacional, é uma mensagem que transcende o momento em que foi escrita. Para Moçambique, a carta de António Carlos do Rosário é mais do que uma crítica, é um chamado à responsabilidade colectiva e à construção de um futuro mais justo e democrático. (Bendito Nascimento)