Por Bendito Nascimento
A história oferece lições valiosas. De Paris em 1789 ao Cairo em 2011, revoluções são momentos de catarse, mas também de profunda introspecção. Se por um lado são impulsionadas por um desejo legítimo de justiça, por outro podem ser corrompidas por práticas que perpetuam as mesmas estruturas que se busca derrubar. E é aqui que precisamos refletir: será que estamos a agir como construtores de uma nova sociedade ou como espelhos do regime da Frelimo que criticamos?
Em Maputo, barricadas nas vias transformaram a cidade em um mosaico de frustração e urgência. Quem tenta atravessar sem “colaborar” é ameaçado. Quem ousa discordar ou manter o silêncio é tratado com desprezo, quando não com violência. Será essa a liberdade que queremos? Será essa a democracia pela qual lutamos? Não nos tornamos, com essas atitudes, cúmplices de uma intolerância que deveria ser característica de quem está do outro lado da luta?
Democracia não é apenas um termo bonito para ser usado nos discursos; é um exercício constante de aceitação e respeito. Quando forçamos outros a alinhar-se à nossa visão, sob pena de violência ou exclusão, estamos a repetir a narrativa do regime que tanto criticamos. Estamos a construir um autoritarismo disfarçado de revolução. E isso, historicamente, nunca termina bem.
Na França revolucionária, o lema de “liberdade, igualdade e fraternidade” rapidamente deu lugar ao período do terror. Os ideais que inspiraram uma nação se tornaram desculpas para guilhotinas e perseguições. Será que estamos à beira de algo semelhante? Será que o Moçambique do amanhã lembrará esse momento como o início de uma nova era ou como um episódio de retrocesso e divisão?
As pedras que hoje bloqueiam as estradas e ferem outros cidadãos também podem ser os alicerces de um país mais justo. Mas isso exige mais do que indignação. Exige visão, organização, compromisso com princípios éticos e, acima de tudo, respeito pelos outros. A revolução verdadeira não é feita apenas de actos de resistência, mas de uma transformação profunda na forma como nos relacionamos com o poder e com o próximo.
No entanto, é impossível ignorar o preço que estamos a pagar. Quando jovens nas estradas pedem dinheiro aos motoristas ou agem de forma coercitiva, transformam uma causa legítima em algo mais sombrio. Quando a polícia responde com balas e gás lacrimogêneo, ceifando vidas inocentes, perguntamos: será que estamos prontos para a liberdade que desejamos?
Eu sou a favor da revolução. Sou a favor de um Moçambique que honre o sacrifício de Eduardo Mondlane, Samora Machel e tantos outros que deram suas vidas pela independência e liberdade. Mas precisamos garantir que esse futuro seja construído com justiça, não com medo. Se permitirmos que a intolerância e o ódio guiem nossos passos, não estaremos a libertar nosso país. Estaremos apenas a escrever outro capítulo de dor e opressão.
A pergunta que deixo, então, é esta: qual Moçambique queremos deixar para nossos filhos? O das panelas que ressoam esperança ou o da intolerância que só alimentam o caos? A resposta está em nossas mãos. Que sejamos sábios o suficiente para escolher o caminho certo.