Num comunicado de imprensa, aquele grupo de deputados da Assembleia da República Portuguesa, apela ao governo de Lisboa para que comunique ao governo moçambicano o não reconhecimento, por parte de Portugal, dos resultados eleitorais das eleições presidenciais, legislativas e provinciais do passado dia 9 de outubro. Eis abaixo na íntegra o comunicado de imprensa do grupo parlamentar português bloco de esquerda.
“No passado dia 9 de outubro de 2024 realizaram-se as eleições presidenciais, legislativas e provinciais em Moçambique. Quinze dias depois, apenas a 24 de outubro, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) moçambicana anuncia os resultados finais, declarando a FRELIMO vencedora em todos os atos eleitorais.
Segundo a CNE, o partido do poder teria ganho as presidenciais com mais de 70% dos votos, reforçando ainda a sua maioria parlamentar. Teria ainda conquistado todas as províncias, elegendo assim todos os governadores possíveis, bem como 731 dos 867 mandatos para as dez assembleias provinciais.
Todo o processo eleitoral decorreu sob inúmeras acusações de falta de transparência e de falta de fiscalização, principalmente nos quinze dias que mediaram entre o dia da votação e o dia de anúncio dos resultados eleitorais. Tem sido ainda marcado pela violência política e a repressão policial contra a população.
Observadores nacionais e internacionais denunciaram situações de adulteração de cadernos eleitorais, com eleitores a dizer que foram impedidos de votar por não constam dos cadernos e com a Missão de Observação Eleitoral da União Europeia a dizer que “se verificou uma notável falta de confiança na fiabilidade dos cadernos eleitorais e na independência dos órgãos eleitorais”.
Registaram-se ainda diversas formas de impedimento de delegados e observadores da oposição, fazendo com que em muitas assembleias de voto existissem apenas observadores da FRELIMO. Sobre este ponto, a missão de observação da CPLP disse terem-se registado “grandes disparidades no número de delegados partidários, com um partido representado [FRELIMO], tipicamente, por dois. delegados, em praticamente todas as mesas, enquanto outros partidos tinham uma presença mais reduzida”.
Têm sido ainda relatados casos de intimidação de eleitores nas secções de voto, preenchimento de urnas com votos não correspondentes a eleitores e desaparecimento de outros votos nos quinze dias entre o dia das eleições e o anúncio dos resultados.
Acresce a tudo isto a intensificação da violência contra adversários políticos – por exemplo, com o assassinato, no dia 18 de outubro, de Elvino Dias, assessor jurídico do partido PODEMOS, e de Paulo Guambe, mandatário da candidatura presidencial apoiada pelo mesmo partido – e a intensificação da repressão contra a população que tem contestado nas ruas os resultados oficiais das eleições de 9 de outubro.
A Amnistia Internacional qualifica o atual momento como “a pior repressão dos últimos anos contra os protestos no país” e o diretor regional adjunto da Amnistia Internacional para a África Oriental e Austral denunciou que “as últimas duas semanas em Moçambique foram marcadas por um derramamento de sangue completamente desnecessário, uma vez que as autoridades tentaram parar um movimento de protesto pacífico com força letal.
O número de vítimas aumenta de dia para dia, com as autoridades a utilizar armas de guerra, incluindo espingardas e veículos blindados, nas ruas da cidade. As pessoas nem sequer podem protestar nas suas próprias casas sem correrem o risco de serem atingidas por gás lacrimogêneo pela polícia”.
O Governo moçambicano tem ainda cortado, de forma reiterada, o acesso à internet e a redes sociais, enquanto intensifica a violência. A manobra é óbvia: tentar silenciar o povo e impedir que o mundo saiba o que está a acontecer. A Human Rights Watch denunciou a situação, dizendo que as restrições de acesso à internet se seguem “à violenta repressão das forças de segurança do Governo contra os apoiantes da oposição que marcharam pacificamente por todo o país” e atentam contra direitos fundamentais e humanos, desde logo os de acesso à informação, liberdade de reunião, de manifestação e de liberdade de opinião.
Perante as denúncias que apontam para várias irregularidades eleitorais, para a falta de transparência e de fiscalização do processo e dos resultados, e perante a intensificação da violência de estado e da repressão sobre a população, o Governo português não deve reconhecer os resultados eleitorais anunciados pela Comissão Nacional de Eleições moçambicana e deve condenar todas ações do governo e das autoridades moçambicanas que violam os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e cidadãs daquele país.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1. Comunique ao governo moçambicano o não reconhecimento, por parte de Portugal, dos resultados eleitorais das eleições presidenciais, legislativas e provinciais de passado dia 9 de outubro;
2. Condene todas as ações do governo e das autoridades moçambicanas que violam os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e cidadãs daquele país;
3. Se empenha activamente em todas as iniciativas diplomáticas que visam pôr termo à repressão de manifestações pacíficas, à violência política e a de detenções arbitrárias motivadas politicamente. Assembleia da República, 7 de novembro de 2024 As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo; Marisa Matias; Joana Mortágua; José Soeiro; Mariana Mortágua.”
Desde os anúncios dos resultados eleitorais pela comissão nacional de eleições de Moçambique dando vitória à FRELIMO e ao seu candidato presidencial Daniel Francisco Chapo, Moçambique vive um clima de caos com manifestações sangrentas em quase todas as capitais provinciais e alguns distritos.