E eu? Lá estava eu, no meio disso tudo, rindo para não chorar. Porque, honestamente, se você não consegue encontrar humor em uma situação tão absurda, corre o risco de enlouquecer. Imagine: de um dia para o outro, os bairros já esquecidos pelo governo a não ser em época de eleições se transformaram em verdadeiras zonas de guerra.
Os “homens catana” entraram em cena como protagonistas de um filme de terror de baixo orçamento. Não, eles não surgiram do nada; estavam ali o tempo todo, esperando a oportunidade perfeita para lembrar a todos que em Moçambique a segurança é um conceito tão fictício quanto a justiça social. Eles patrulham as ruas com machetes em punho, invadindo casas, saqueando vidas e espalhando o tipo de terror que transforma qualquer sonho em insónia.
E o governo? Ah, a FRELIMO, essa senhora experiente em manipulações, parece assistir a tudo com um misto de prazer e conveniência. Afinal, nada como um pouco de caos para justificar o endurecimento das leis, o aumento das patrulhas e, claro, mais controle sobre uma população já exausta. Quem ousa questionar as intenções do partido? Apenas os tolos e os desesperados categorias nas quais, devo admitir, me encaixo confortavelmente.
Mas não se engane. Eles não pararam por aí. A repressão veio, como sempre, carregada de armas e desculpas esfarrapadas. As forças de segurança, que deveriam proteger o povo, agora patrulham os bairros como se fossem caçadores em busca de suas presas. E quem são essas presas? Qualquer um que ouse questionar, resistir ou simplesmente existir no lugar errado, na hora errada.
Os relatos de tortura e execuções sumárias são tantos que já nem chocam mais. Tornaram-se parte da paisagem, como a poeira que cobre as ruas ou os sorrisos falsos dos líderes nos noticiários. Ah, sim, os noticiários. As TV’s continuam fazendo seu papel com perfeição: pintar um quadro de um país próspero e feliz, enquanto, fora da tela, o caos consome tudo.
Na tela, o Comandante Geral aparece com sua expressão serena, prometendo ordem e Tranquilidade. Ele fala de crescimento económico, de combate à pobreza e de desenvolvimento sustentável, como se essas palavras tivessem algum significado real para quem vive debaixo das sombras das catanas. É quase cómico se não fosse tão trágico assistir a essa desconexão entre o discurso oficial e a realidade.
Eu observo tudo isso com uma mistura de indignação e cepticismo. Porque, veja bem, não é como se isso fosse uma novidade. Moçambique tem um histórico invejável de transformar promessas em decepções. Desde a independência, fomos de um sonho de liberdade para uma realidade onde o medo é a única constante.
E agora, com a oposição tentando sobreviver em meio a fraudes eleitorais descaradas e assassinatos políticos, fica claro que a democracia, se é que algum dia existiu, já foi enterrada. Mas, como bons moçambicanos, aprendemos a viver com isso. Nos adaptamos, nos calamos e, às vezes, rimos. Porque o humor, por mais negro que seja, é uma das poucas coisas que ainda nos pertence.
Mas nem todos estão dispostos a se calar. Nos cantos mais escuros das cidades, onde as câmeras do regime não alcançam, pequenos actos de resistência começam a surgir. Uma música aqui, um panfleto ali, uma reunião clandestina acolá. São gestos tímidos, mas cheios de coragem. Porque, em um país onde falar a verdade é um ato de subversão, qualquer palavra dita em voz alta carrega o peso de uma revolução.
E é isso que me dá esperança, mesmo quando tudo parece perdido. Ver que, apesar de tudo do medo, da repressão, da violência, ainda há aqueles que se recusam a desistir. Que continuam lutando, mesmo sabendo que as chances estão contra eles.
Ao mesmo tempo, não consigo deixar de me perguntar: até quando? Até quando vamos tolerar um sistema que nos prende, nos mata e ainda exige nosso agradecimento? Até quando vamos aceitar viver como prisioneiros em nossa própria terra, com nossos direitos reduzidos a nada mais do que palavras vazias em uma constituição ignorada?
Eu gostaria de terminar esta crónica com uma resposta, mas a verdade é que não sei. O que sei é que, enquanto puder escrever, observar e rir da tragédia que se desenrola diante de mim, continuarei a fazer isso. Porque, no final das contas, a palavra ainda é a arma mais poderosa que temos.
E, quem sabe, um dia ela seja suficiente para mudar alguma coisa. (Dedos D’eus)