Por: Nando Mabica
O anúncio da criação de uma Comissão de Inquérito pelo Governo do Presidente Filipe Nyusi, liderada pelo vice-ministro da Justiça e pelo porta-voz do Conselho de Ministros, simboliza uma tentativa de demonstrar compromisso com a responsabilização e a transparência. No entanto, a decisão de permitir que o próprio governo investigue suas falhas gera um paradoxo: até que ponto a instituição fiscalizadora é capaz de fiscalizar-se de maneira imparcial e eficaz?
O incidente expõe deficiências alarmantes, incluindo fragilidades na vigilância, falhas nos protocolos de segurança e possíveis actos de negligência ou corrupção dentro da administração penitenciária. A escala do evento sugere que as brechas no sistema vão além do mero descuido, podendo envolver conivência de agentes internos ou até redes externas organizadas.
Além disso, relatos de uso excessivo de força na operação de recaptura incluindo mortes de reclusos apontam para possíveis abusos de poder e violações de direitos humanos, ampliando a crise institucional.
Embora a criação da Comissão seja um passo necessário, a ausência de prazos claros para a conclusão do inquérito alimenta o ceticismo público. A falta de transparência em processos anteriores levanta dúvidas sobre a eficácia real da iniciativa. Para resgatar a confiança, é essencial que: Prazos concretos sejam estabelecidos para a conclusão do relatório, Relatórios preliminares sejam divulgados em intervalos regulares;
Observadores independentes, incluindo organizações da sociedade civil, têm acesso ao processo.
Mais do que uma resposta pontual, o evento exige reformas estruturais que fortaleçam a integridade do sistema prisional. Entre as medidas prioritárias estão:
- Investimento em segurança e tecnologia para monitoramento eficiente das instalações;
- Treinamento e qualificação dos agentes penitenciários, com foco em ética e direitos humanos;
- Combate à corrupção sistêmica, envolvendo auditorias independentes e punição exemplar para envolvidos em irregularidades.
- Dada a gravidade das violações relatadas, é imprescindível que a sociedade civil e as organizações de direitos humanos desempenhem um papel activo no monitoramento das investigações. Essas entidades podem actuar como guardiãs da justiça ao:
- Exigir transparência e imparcialidade no processo;
- Denunciar possíveis violações de direitos humanos durante e após a fuga;
- Fornecer apoio às vítimas e pressionar por reparações adequadas.
A eficácia da resposta do governo será medida pela sua capacidade de implementar mudanças concretas que previnam episódios semelhantes no futuro. A legitimidade da Comissão de Inquérito depende de sua transparência, imparcialidade e capacidade de produzir resultados tangíveis.
Por fim, somente um esforço conjunto envolvendo o governo, a sociedade civil e organismos internacionais poderá fortalecer as instituições democráticas e promover um sistema de justiça que respeite os direitos humanos e proteja a sociedade moçambicana.