A decisão foi noticiada esta segunda-feira pela Reuters e marca mais um revés no processo que a empresária enfrenta, movido pela operadora de telecomunicações angolana Unitel, da qual foi acionista maioritária.
O caso em questão está relacionado com alegados empréstimos fraudulentos concedidos pela Unitel à empresa holandesa Unitel International Holdings (UIH) em 2012 e 2013, que foram usados para financiar a aquisição de participações em outras empresas de telecomunicações. Na época, Isabel dos Santos era diretora da Unitel e proprietária da UIH, que, apesar do nome, não tem ligação direta com a operadora angolana. A empresária perdeu o controlo da Unitel em 2020, mas ainda detém a totalidade da UIH.
Em dezembro do ano passado, o juiz Robert Bright do Supremo Tribunal Comercial de Londres emitiu uma ordem de congelamento mundial dos bens de Isabel dos Santos, afirmando: “Não vejo nenhuma base óbvia para que os bens de Isabel dos Santos sejam protegidos nesta jurisdição; parece haver um argumento óbvio a favor de um congelamento mundial dos seus bens,” segundo a agência Lusa. O Supremo Tribunal de Londres confirmou agora essa decisão, ao rejeitar o pedido de recurso da empresária.
Os advogados que representam a Unitel argumentam que Isabel dos Santos prejudicou a empresa ao emprestar 323 milhões de euros e 43 milhões de dólares (aproximadamente 38,5 milhões de euros, ao câmbio atual) à UIH a taxas de juro que consideram “injustificadamente baixas” e sem garantias significativas, conforme detalhado pelo site Maka Angola. Para a operadora angolana, a decisão de Isabel dos Santos de emprestar esse dinheiro visava unicamente o seu benefício pessoal e representou uma violação dos deveres de diligência, cuidado e lealdade em relação à Unitel.
Além disso, a Unitel alega que a UIH não paga qualquer juro relativo ao empréstimo desde o final de 2019, início de 2020. A empresária, por sua vez, defende que é vítima de uma “perseguição política” conduzida a partir do palácio presidencial em Luanda, pelo Presidente de Angola, João Lourenço. Isabel dos Santos alega que esta campanha de opressão é responsável pela incapacidade da UIH de reembolsar os empréstimos, uma vez que os seus ativos foram alegadamente apreendidos de forma ilegal.
Actualmente, Isabel dos Santos reside no Dubai, onde tem conseguido evitar o pedido de detenção provisória emitido pela Procuradoria-Geral de Angola no final de 2022. Na altura, as autoridades angolanas solicitaram uma “Red Notice” à Interpol, um pedido que serve para localizar e prender provisoriamente uma pessoa até à extradição, entrega ou ação legal semelhante. No entanto, os Emirados Árabes Unidos não têm um acordo de extradição com Angola, o que tem dificultado a execução do mandado.
Segundo o Centro de Estudos para o Desenvolvimento Económico e Social de África (CEDESA), os Emirados Árabes Unidos não estão a cumprir as suas “obrigações legais internacionais,” possivelmente devido ao facto de se terem tornado um “ponto global de refúgio e acolhimento de várias pessoas politicamente expostas, recebendo avultados rendimentos por esse papel de proteção.”
A empresária, que outrora detinha vários interesses em Portugal, finalizou, em julho deste ano, a venda total da sua participação no banco EuroBic (42,5%) ao banco galego Abanca, concluindo assim os seus investimentos em território português. Esta transação era o último resquício da sua influência no país, onde também tinha interesses na Galp, Efacec e NOS.
Por outro lado, a recuperação de ativos por parte das autoridades angolanas tem sido difícil. Em agosto, quatro organizações da sociedade civil angolana – Mãos Livres, Omunga, Pro Bono Angola e Uyele – enviaram cartas aos procuradores-gerais de Angola, Hélder Pitta Gróz, e de Portugal, Lucília Gago, expressando a sua “preocupação” pelo facto de ambos os países não terem chegado a um acordo para a devolução dos bens confiscados a Isabel dos Santos em Portugal.
O jurista Rui Verde, numa declaração à VOA em agosto, referiu que Angola tem encontrado muitas dificuldades para recuperar os ativos no estrangeiro. “Por um lado, a Procuradoria-Geral da República angolana não tinha experiência em lidar com estes assuntos – é óbvio –, por outro lado, os Estados também não querem ver sair milhões e milhões dos seus PIB, dos seus bancos, dos seus mercados financeiros.” (EXECUTIVE DIGEST)