O problema já preocupa os pacientes e seus familiares que deparam-se com essa situação quando necessitam de uma transfusão de sangue. Os profissionais de saúde por vezes propositam a morosidade e a complexidade do processo para extorquir o cidadão.
De acordo com o Observatório há situações de famílias que, mesmo cumprindo com todas exigências hospitalares, não conseguem a transfusão de sangue para seus entes queridos e alguns até acabam por perder a vida.
“Actos desta natureza fazem parte de problemas que atentam contra o direito universal e equitativo à saúde em Moçambique, contrariando os princípios do estatuto do Serviço Nacional de Sangue ”, escreve o Observatório Cidadão para a Saúde.
Odivalda Domingos, de 45 anos de idade, diz que foi obrigada a pagar para beneficiar-se de transfusão de sangue em Abril do ano passado no Hospital Geral de Mavalane, na capital moçambicana. Conta que, após uma consulta, os médicos descobriram que ela estava com níveis de sangue baixo.
Na ocasião, os médicos decidiram pelo internamento e transfusão de sangue à paciente, trabalho incumbido a uma enfermeira. Esta, por sua vez, criou dificuldades alegando falta do líquido no momento e cobrou à paciente 2500 meticais para facilitar o procedimento.
Um cenário similar aconteceu na província de Manica com Costinho Kimbine. Ele diz que foi obrigado por enfermeiro a pagar 1800 meticais, há cerca de dois anos, para transfusão de sangue para sua esposa, depois de um parto à cesariana, no Hospital Provincial de Chimoio.
Aliás, esta não foi a primeira vez de Costinho. Segundo ele, já participou na mobilização de dinheiro, em três ocasiões, para a família pagar dinheiro exigido por um profissional de saúde para facilitar disponibilidade de sangue para tratamento da irmã que tem anemia.
Morosidade para transfusão desespera pacientes e famílias
Por outro lado, o Observatório do Cidadão para a Saúde descobriu situações de famílias e pacientes que, mesmo tendo reunido o número de dadores exigidos pelos hospitais, não se beneficiaram da transfusão de sangue, segundo contam diversas fontes.
Sónia Silvano Sitóe, de 42 anos de idade, é uma paciente que está à espera de transfusão de sangue para uma cirurgia há cerca de três anos. A família afirma estar desesperada e que não entende a razão da demora, uma vez que conseguiu reunir o número de dadores que o Hospital Provincial da Matola exigiu para a transfusão de sangue e posterior cirurgia.
“Nós conseguimos três dadores exigidos pelo hospital, mas até agora não temos resposta sobre a transfusão ou operação. Então, por que nos disseram para trazer doadores urgentemente se sabiam que o processo demoraria tanto tempo para salvar a minha irmã?”, questionou Francilda Sitóe, irmã da paciente.
Outro relato chega da província de Tete. Cristina Vijalone, acredita ser artimanha de alguns profissionais de saúde atrasar os processos de transfusão como forma de procurar tirar benefícios.
Ainda no decurso das investigações, o Observatório do Cidadão para a Saúde encontrou uma paciente em desespero no banco de sangue do Hospital Geral de Mavalane, na cidade de Maputo. Luísa Cumbe, de 38 anos de idade, que sofre de miomas, tem cirurgia marcada para o dia 1 de Outubro, mas a unidade hospitalar alega indisponibilidade de sangue.
“Eu sou doador de sangue há quatros anos, mas quando quero ajudar a minha cunhada alegam que não há disponibilidade de sangue. E faço doação com regularidade. Então, isso me faz pensar que estão a ser selectivos para beneficiarem a quem eles quiserem”, contou Xadreque Mandlate, um dador de sangue.
Mesmo cientes da ilegalidade das cobranças para facilitação do mesmo e processo de transfusão de sangue, muitas famílias não denunciam alegando receio de represálias se voltarem às mesmas unidades hospitalares em busca de cuidados médicos.
Associação defende maior valorização dos dadores de sangue
Para a Associação Nacional dos Dadores de Sangue, as reclamações sobre negociatas de sangue para transfusão não são novidade no país. Na província de Maputo, por exemplo, chegam dezenas de queixas por ano desses casos revelou o delegado daquela associação a nível daquela parcela do país, Serafim Namuera.
Por sua vez, o presidente da mesma associação, Sérgio Macheque, fala da existência de cenários preocupantes de mau atendimento aos dadores de sangue em algumas unidades hospitalares. Estas situações, segundo Macheque, contribuem para retrair doadores voluntários.
Preocupada com a situação, a Associação defende a necessidade do Serviço Nacional de Sangue cumprir na íntegra as suas atribuições como forma de conferir maior dignidade a este grupo, criar mecanismos para combater negociatas de sangue e humanizar a prestação dos serviços de saúde no atendimento aos dadores de modo a atrair mais voluntários.
Defendem a necessidade de revisão do estatuto do Serviço Nacional de Sangue de modo a conferir diversos privilégios aos dadores voluntários, como forma de chamar este grupo.
Refira-se que o Serviço Nacional de Sangue é a entidade de gestão, coordenação, orientação, regulamentação, formação, acreditação, monitoria e fiscalização das actividades relacionadas com a doação e a transfusão do sangue e seus derivados. (Integrity/ Observatório Cidadão para a Saúde)