Ngoenha, que foi uma das figuras centrais na génese da iniciativa, recordou que a intervenção de académicos, activistas e ONGs surgiu em resposta ao pico de violência gerado pelas manifestações eleitorais. Segundo ele, a motivação principal para “bater portas” e levar as lideranças políticas à mesa foi a responsabilidade de estancar a violência.
O filósofo destacou o papel de Venâncio Mondlane como seu “maior interlocutor nesse período”, e revelou ter convencido o então Presidente Filipe Nyusi a convidar os líderes a dialogar. O objectivo do grupo era encontrar uma “saída pacífica para o país”, que passava pela discussão de cenários como um governo de unidade nacional, institucional ou técnico, para implementar “reformas profundas no país”.
A frustração de Ngoenha reside no momento em que o processo saiu do seu controle, ao ser absorvido pelas estruturas internas dos partidos. “O processo, à medida que ia entrando nas instituições, ela foi nos escapando pela mão. É por isso que eu disse que, a dada altura, eu já não me reconhecia no que aconteceu”, declarou.
Um dos pontos de discórdia foi a perda da autonomia do grupo de mediadores. A intenção inicial era que o diálogo não fosse visto como uma “iniciativa presidencial”, mas sim que os partidos políticos tivessem a “direcção deste processo”, sentando-se com o Presidente “como iguais”.
Ngoenha lamenta que o Diálogo acabou por ser percebido como uma “proposta presidencial do novo presidente, com os partidos políticos a serem arrastados por trás”, o que comprometeu a sua essência inclusiva e de igualdade de poder.
Apesar das críticas ao formato e do desvio dos objectivos iniciais, o filósofo defende a importância da sua intervenção. O principal feito, segundo ele, foi a drástica redução da violência após o encontro entre Daniel Chapo e Venâncio Mondlane.
“Oficialmente não morreu mais ninguém”, destacou Ngoenha, sublinhando que o esforço, feito “em consciência”, alcançou o objectivo crucial de diminuir as mortes.
Para Ngoenha, o formato do diálogo, mesmo “não sendo o caminho ideal”, ainda representa uma “possibilidade” para lutar por um Estado moçambicano reformado, com uma convivência pacífica e uma redistribuição social e económica mais equitativa. (Ekibal Seda)