Nesta semana, a ENI anunciou a decisão final de investimento para o projecto Coral North FLNG, marcando o início oficial da sua implementação. Em paralelo, a TotalEnergies e o governo moçambicano confirmaram planos para retomar o projecto Mozambique LNG, enquanto a ExxonMobil assinalou progressos no Rovuma LNG.
Esses desenvolvimentos ocorrem num contexto de instabilidade persistente em Cabo Delgado, onde a violência insurgente voltou a intensificar-se desde julho de 2025. Multiplicam-se ataques contra viajantes e aldeias próximas da cidade de Palma, incluindo duas ofensivas recentes em Mocímboa da Praia.
A estratégia de segurança da TotalEnergies, centrada na protecção do complexo de Afungi, tem sido criticada por isolar as operações e deixar as comunidades vizinhas mais vulneráveis. Além disso, problemas de reassentamento permanecem sem solução, e muitas famílias reassentadas continuam com acesso limitado a meios de subsistência.
Analistas alertam que a reactivação do projecto da TotalEnergies pode alimentar o recrutamento de insurgentes e agravar o descontentamento local, especialmente devido à criação de zonas de segurança exclusivas que restringem a circulação das populações.
“Levantar a força maior sem resolver as questões sociais e de direitos humanos pendentes demonstra falta de responsabilidade e cuidado com as pessoas directamente afectadas”, afirmou Anabela Lemos, da organização Justiça Ambiental! “Esses projectos devem ser interrompidos, e as terras e o mar devolvidos às comunidades locais.”
Para Antoine Bouhey, da Reclaim Finance, o avanço do Coral North FLNG depende da aprovação de mais de 30 instituições financeiras, entre elas o Crédit Agricole, a Société Générale e o Standard Chartered. “Dada a ausência de uma investigação independente sobre o alegado massacre de 2021, os financiadores não devem passar um cheque em branco a um projecto tão perigoso”, afirmou.
Também Sonja Meister, da organização alemã Urgewald, condenou a cumplicidade de empresas e bancos europeus: “É escandaloso que a Siemens Energy e o Deutsche Bank apoiem este projecto, apesar das graves violações de direitos humanos e das investigações em curso.”
Na mesma linha, Lorette Philippot, da Friends of the Earth France, considera que “a estratégia agressiva da Total para reiniciar o GNL Moçambique ameaça provocar novos desastres humanos e ambientais”.
Por sua vez, Diogo Silva, da BankTrack, apelou aos principais bancos comerciais envolvidos, entre eles o Standard Chartered, o Crédit Agricole, o Standard Bank, o Mizuho e o MUFG, a retirarem o seu apoio financeiro: “Agora é o momento de cumprirem o que dizem sobre protecção do clima e dos direitos humanos.”
Com a instabilidade a persistir em Cabo Delgado e as queixas comunitárias sem resposta, a expansão do gás em Moçambique continua a levantar sérias dúvidas sobre quem realmente beneficia desses projectos e quem paga o preço. (Nando Mabica)