Foi em Matola Gare, na semana passada. Disparos feitos por homens armados atingiram a viatura onde Eunice seguia. Testemunhas dizem que o alvo seria um agente da Polícia da República de Moçambique (PRM). Mas, como sempre, quem paga é o povo.
No dia do funeral, o choro tornou-se grito. Centenas de pessoas acompanharam o corpo da jovem num silêncio pesado, interrompido apenas por vozes de revolta e desespero. Entre elas, uma mulher, tida como avó da vítima, ergueu o rosto molhado de lágrimas e disse, num tom que misturava dor e ironia:
“Obrigado, governo, por ter tirado a vida da única filha desta família. Por falta de controlo dos vossos polícias, agora enterramos o nosso futuro.”
A multidão chorava. Não apenas por Eunice, mas por todos os filhos e filhas que já partiram, mortos pela violência, pela fome, pela indiferença.
Com voz trémula, a idosa continuou:
“Estamos pedindo ao nosso governo que nos olhe com humanidade. Todos os dias morremos de fome, sem dinheiro, sem comida… e agora também com as vossas armas. Obrigado, governo, por tudo o que nos fazem, por nos matarem sem piedade.”
As palavras ecoaram como um apelo que ninguém quis ouvir. O governo cala-se. A polícia silencia. Nenhum pedido de desculpas, nenhuma explicação, nenhum gesto de compaixão. O silêncio tornou-se cúmplice, e o povo sente-se abandonado.
Para muitos moçambicanos, a morte de Eunice é mais do que uma tragédia, é um símbolo do descaso, da impunidade e da distância entre os que governam e os que sofrem. É o retrato cruel de um país onde as balas falam mais alto que a justiça, e onde a vida de um jovem parece não ter valor.
Até hoje, nenhuma autoridade assumiu responsabilidade pelo que aconteceu em 1 de Outubro, em Matola Gare. Nenhuma voz oficial se levantou para consolar, para esclarecer, para mudar.
E assim, entre lágrimas e revolta, o povo repete a mesma pergunta que já se tornou clamor nacional:
Até quando o governo vai assistir, em silêncio, à morte dos seus próprios filhos? (Nando Mabica)