Segundo um estudo do MISA Moçambique, 2023 ficou marcado por um aumento expressivo nos casos de violações contra jornalistas, particularmente no contexto das eleições autárquicas, que amplificaram tensões e conflitos. A monitoria realizada pela organização aponta que as agressões físicas, intimidações e casos de censura mais que duplicaram em relação a 2022. Este aumento não apenas evidencia o agravamento de práticas repressivas, mas também a falta de mecanismos eficazes para a proteção dos direitos fundamentais dos jornalistas.
Um dos episódios mais “alarmantes” foi a morte do jornalista João Chamusse, ocorrida num contexto ainda envolto em controvérsias, mas amplamente visto como um reflexo do ambiente hostil contra a liberdade de imprensa. Além disso, casos de censura directa e ameaças tornaram-se comuns durante o período eleitoral, dificultando o trabalho da imprensa independente em um momento crítico para a democracia no país.
O ambiente político no país tem exercido influência directa sobre a liberdade de imprensa. As tensões entre o governo liderado pelo partido Frelimo de Filipe Nyusi e partidos da oposição criaram um cenário de polarização, onde jornalistas e meios de comunicação são frequentemente tratados como alvos em disputas de poder. Durante as eleições autárquicas de 2023, diversos casos de intimidação foram reportados, incluindo detenções arbitrárias de jornalistas que cobriam manifestações e comícios políticos.
A censura também se manifestou por meio de restrições impostas às rádios comunitárias, que enfrentaram dificuldades para operar em áreas rurais, onde as informações são escassas e o acesso à mídia alternativa é vital. Muitas dessas rádios foram fechadas ou tiveram seus equipamentos confiscados sob pretextos administrativos, mas analistas acreditam que as ações foram motivadas por interesses políticos.
Embora a Constituição moçambicana garanta a liberdade de imprensa e o acesso à informação, na prática, as proteções legais têm se mostrado insuficientes. A ausência de uma entidade reguladora independente e a interferência política em órgãos de comunicação estatais contribuem para o enfraquecimento da prática jornalística.
O MISA Moçambique destacou ainda a falta de respostas por parte das autoridades aos casos de agressões contra jornalistas. A impunidade tornou-se a regra, com poucos ou nenhum progresso em investigações sobre ameaças e ataques. A morte de João Chamusse é um exemplo claro dessa tendência, já que o caso permanece sem desfecho, gerando preocupação entre os profissionais de imprensa e organizações de direitos humanos.
O ano de 2023 deixou claro que a liberdade de imprensa em Moçambique está sob ataque. Os desafios enfrentados pelos jornalistas refletem um ambiente político e social marcado por repressão, censura e impunidade.
De acordo com o Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa 2024 do Repórteres sem Fronteiras, Moçambique se encontra na posição 105 em um universo de 180 países, três pontos diferentes do ano passado, quando o país ocupava a posição 102, em um ranking onde actualmente a Noruega ocupa a primeira posição, enquanto a Eritreia fica na posição 180.
E, a isso o retrocesso no presente ano, os Repórteres sem Fronteira clarificam “A reeleição de Filipe Nyusi e o frágil acordo de paz alcançado com a ex-rebelião armada não frearam o preocupante declínio da liberdade de imprensa em Moçambique”. (Bendito Nascimento)