Por Almeida Maria, Outubro de 2025
Mas quem é esse Raymond? O fantasma que dita mortes
Na ficção, Raymond Reddington é um criminoso sofisticado, estratega e manipulador, que entrega nomes ao FBI com propósitos obscuros. Em Moçambique, não há série de televisão, mas há uma realidade que se desenrola com roteiro trágico. Os assassinatos de agentes da polícia, jornalistas, activistas e cidadãos comuns seguem um padrão: execução precisa, silêncio institucional e investigações que se perdem no nevoeiro da burocracia.
A pergunta que ecoa nas esquadras, nas redações e nas ruas é: quem dá as ordens? Quem decide quem vive e quem morre? Quem é o autor intelectual por trás das balas silenciosas?
A lista que nunca é revelada. Os esquadrões da morte — oficialmente negados pelo governo (“Não existem esquadrões da morte em Moçambique” — Ministro do Interior, Paulo Chachine) — continuam a operar como se tivessem imunidade. São grupos armados, muitas vezes ligados a interesses políticos, que eliminam vozes dissonantes. A cada assassinato, as ladainhas mal entoadas oficiais se repetem: “Estamos a investigar”, “Não há provas suficientes”, “Desconhecemos os autores”. Mas os nomes continuam a cair, como peças num tabuleiro invisível.
A negação oficial contrasta com a evidência empírica. Os crimes têm assinatura, têm padrão, têm alvo. Mas não têm culpado.
O verdadeiro Raymond Reddington moçambicano não precisa aparecer. Ele opera nas entrelinhas, nos gabinetes, nos telefonemas cifrados. Sua arma mais poderosa é o silêncio institucional. A ausência de respostas transforma o Estado em cúmplice involuntário — ou voluntário? — de uma máquina de morte que se alimenta da impunidade.
Este artigo não pretende apontar nomes, mas sim provocar perguntas. Porque enquanto não soubermos quem é o Raymond, todos corremos o risco de estar na sua lista. A indignação precisa sair das redes sociais e ocupar os espaços públicos. Precisamos de uma cidadania activa, que exija respostas, que questione narrativas, que recuse o papel de figurante num país onde a morte virou rotina.
A série precisa acabar. Moçambique não é um episódio de The Blacklist. Não pode ser. A vida real exige justiça, transparência e responsabilização. O país precisa encerrar esta temporada de terror e escrever um novo roteiro — onde os nomes não sejam entregues para execução, mas para proteção. Onde Raymond Reddington seja apenas um personagem de ficção, e não um símbolo da impunidade nacional.
