Nós, na nossa humildade (a)típica assistíamos, em cadeia nacional, nossos analistas, de lábios adoçados, debruçar sobre as crises sociais e pós-eleitorais, tentativas de golpes, e deslizavam sobre aquelas matérias com propriedade; falavam de Sahel, como se de um quintal vizinho se tratasse, igual um carniceiro entende de sua arte. Não havia algemas ou meias-palavras para chamar nomes e colocar os pontos nos respectivos i’s àquele jogo de cintura entre Laurent Koudou Gbagbo vs Alassane Ouattara, que mergulhou Costa de Marfim numa prolongada guerra civil pela sucessão; mas, nos assuntos domésticos, nas nossas crises pós-eleitorais, as teorias encontram outras explicações, nomes, e tudo que se seguiu, criou cegueira, sem nenhuma relação com as perguntas bem colocadas aquando dos eventos da diáspora turbulenta.
Por: Leonnel Mucavele
Ainda assim, esses eventos, desperta a parte mais sensível de cada um de nós. Enquanto uns mais comedidos, por conseguinte, rotulados covardes, pelas ponderações, outros, ousados, inspirados nas incursões dos déspotas do mundo, da África, em particular, revelam‐ se revolucionários do caos, exalam extremismo político sem precedentes. Ainda, há quem nessa encruzilhada chamada Moçambique, encontrou as chaves do País, e foi se, arriscou e hoje, experimenta outras extravagâncias políticas pelo mundo fora.
Mas, como moçambicanos que somos, no caos nos revelamos resilientes. Reerguemo‐nos, sistematicamente normalizamos a anarquia, a desordem pública, furtos, as destruições, como fizemos ao longo do tempo com a corrupção, intolerância, lobbies, lambebotismo, tirania e a lista vai longa, como a própria História, não se coibirá de aplicar a sentença. Nesse percurso de Tempo, o atordoado livre-trânsito nas portagens, é menos grave que a idoneidade das autoridades para explicar o público a natureza dos contratos e a contraparte dos negócios à sua volta.
Hoje em dia, as vítimas da exclusão e da intolerância de outrora, são os justiceiros e sanguinários da fauna, e em nome de revolução, enfeitam murros de sangue de quem também vive clamando “povo no poder”. A intelectualidade passou a ser medida pela simpatia com a causa, não pela profundidade dos seus argumentos ou raciocínio dos seus autores, como nunca visto, e títulos académicos atribuídos na praça pública pelas massas, gente que não leu além do prefácio das obras dos seus arguidos.
As ruas frustram‐ se pelo linguarejando usado para dissimular o óbvio, assumem dianteira na atribuição de títulos honoríficos. Dividem em classe os académicos e ditam o ritmo de governação, do poder legislativo, até do judicial. Monitoram o custo de vida, aplicam regras ao sistema financeiro e reservam para si as análises das oscilações, balancetes, PIB, Bolsa de Valores, Tesouro, alguns destes estudos resultaram no pagamento do 13° salário de 2024.
Há um pouco de tudo. Uma ANARQUIA que lesa a pátria. Seus efeitos estendem‐ se às lojas, fábricas e supermercados, transformados em escombros (Shoprite da Macia) e o encerramento das indústrias pariu desempregados, cujas lágrimas, ironicamente, “valem menos que a nobreza na causa”. E mais, ultimamente, escolas e hospitais, funcionam a reboque dessa gente, curiosamente os enfermeiros e até professores, condicionam o exercício de suas funções ao pagamento de horas extras/turno meio. Há porta-voz para suas reivindicações, gente, com procuração para falar em nome das classes. E em algumas dessas instituições, mesmo que públicas, ao belo prazer, nomes nas lápides, são editados; novas avenidas e bairros surgem com novas designações; outros secretários são empossados, julgam litígios sem legitimidade nas matérias; decretos são forjados, uns em Boletim da República, outros no Jornal do Povo, promulgados para o mesmo cidadão, ainda assim, poucas vozes se atrevem falar da ANARQUIA que se vive nesse território, o temor pelo linchamento se sobrepõe à autoridade legalmente construída, mesmo que se queira ignorar, depreende‐ se sem muito esforço a falência do Estado.
E os saques ao longo da EN1? As barricadas e extravios de pertences dos viajantes, ninguém se responsabiliza. Aqui, o Estado também encolheu‐ se e assiste nos camarotes cidadãos com opiniões e vozes seviciadas, trocam‐ se os papéis, outros actores mutilam a liberdade de expressão. Erguem‐ se e ordenam encerramento de comércio, como que em Inharrime, dos pontos mais violentos na onda das manifestações, porém, os órgãos do Estado, refém de vontades (i)legítimas de intransigências das ruas.
De igual modo, essas contrapartidas alastram- se ao CREDELEC, ninguém explica as razões do pagamento da taxa de lixo e rádio nas custas da já encarecida energia que nos países vizinhos usa‐ se a preços bonificados, o mais agravante, é que tal também se verifica no campo, nas zonas rurais, onde não há nenhum sistema de recolha de lixo, como se tenta fazer parecer nas Vilas Municipais. Também não há porta‐voz para o preço do cimento, que segundo informações, mesmo com matérias‐primas compatriotas, a Dugongo é obrigada a aplicar preços em nome da sobrevivência da concorrência, e feito de camaleão ou sapo, se adapta aos preços aplicados no mercado estrangeiro para exportar seu produto.
E, em alguns casos, é na ausência de porta-voz onde os problemas crescem e atingem barbas brancas, e a assessoria vem de gente que mesmo com chuva de pedrada, a todo custo rema para ver o comboio “Moçambique” de volta ao cariz, como defendeu o economista Gabriel Muthisse, na sua página do Facebook: “Tenho ouvido que a Dugongo exporta cimento para a ESwatini e para a África do Sul a preços mais baixos. Pode ser. A indústria cimenteira sul-africana opera numa escala maior, com custos logicamente mais baixos. Em economia, quando a escala de produção é grande, os custos tendem a ser menores, o que se reflecte nos preços ao consumidor. Os preços da Dugongo na África do Sul não representam ameaça às outras fábricas de cimento daquele país.”
Portanto, o exemplo do cimento pode replicar se aos demais produtos, que embora produzidos localmente, não tem abertura para o mercado internacional. Aqui, vale discutir assunto de IVA e os moldes em que alguns deles são produzidos ou importados. Mas convenhamos, há muito que se estudar os moldes de aplicação dos preços nos nossos mercados, e acima de tudo, mandar à sepultura a arrogância, fazendo renascer uma comunicação debeladora das chamas.
E, porque não falta arte nessa gente, os ventos chegados da Ponta Vermelha atestam um reajuste dos preços dos produtos da primeira necessidade, mas de que vale e sob que sacrifício para o Estado? Que impacto terá no bolso de um cidadão com capacidade de compra muito aquém do desejável? O reajuste no custo de vida repõe o tecido social severamente comprometido?
Como chegamos a isto?