Dinamarquesa Maersk transporta madeira ilegal de Moçambique para a China

O grupo dinamarquês Maersk fez, nos últimos anos, o transporte marítimo de várias cargas de madeira ilegal de Moçambique para a China, revela uma investigação feita por jornalistas em Maputo e na Dinamarca e publicada esta quinta-feira.

“A empresa transportou madeira ilegal de Moçambique para a China várias vezes entre 2019 e 2021”, escrevem o dinamarquês “Danwatch” e o “Zitamar News”, com redação em Maputo e Londres, referindo transportes que somaram milhares de toneladas.

A consulta de documentos permitiu confirmar várias cargas, como uma em 4 de fevereiro de 2020, quando um porta-contentores propriedade do gigante dinamarquês chegou ao porto de Ningbo, na China, tendo a bordo 255 toneladas de madeira ilegal proveniente da Beira, em Moçambique.

“Mais especificamente, troncos inteiros e não transformados da espécie de árvore tropical castanho-avermelhada Nkula, que só é encontrada em alguns países africanos e estima-se que esteja perto da extinção”, refere-se na reportagem.

Em janeiro de 2020 dois outros navios da Maersk chegaram ao mesmo porto na China com quatro mil toneladas de madeira ilegal vinda de Moçambique, mais um dos dados de importações chinesas que a “Danwatch” e o “Zitamar News” obtiveram através do C4ADS, organismo dos Estados Unidos que faz recolha de dados focado no comércio ilícito e na segurança global.

Há ainda registos em 2019 e 2021, sendo estas e outras cargas de Nkula, Mondzo e Chanato, todas variedades de madeira valiosas e na lista de espécies nativas das autoridades moçambicanas.

A gigante dinamarquesa, que não negou ter feito esse transporte, não está expressamente a violar a lei, explicam os autores do artigo depois de consultar a lei moçambicana e especialistas na área, mas denunciam uma prática que o grupo diz condenar e que o faz contornando a lei.

A Maersk reconhece que tem a responsabilidade de garantir que a carga nos navios seja legal, mas resguarda-se na análise de que cabe às autoridades aprovar um produto para exportação.

Isto porque a lei de Moçambique para as exportações de madeira apenas diz que não é permitida a exportação de madeira não processada de espécies nativas, mas a proibição não faz referência a transporte ou logística.

No seu último relatório de sustentabilidade, a Maersk escreve que está “particularmente preocupada em travar o comércio ilegal de madeira” e que é sua política “não tolerar o transporte de animais selvagens e plantas proibidas pela legislação internacional ou nacional”, lê-se no artigo.

“Estamos cientes de que há desafios, mas é uma área complexa”, escreveu a Maersk num resposta por e-mail ao “Danwatch” e “Zitamar News”, afirmando que acredita que está a fazer o que pode para rastrear a carga a bordo dos seus navios.

O embaixador da Dinamarca em Moçambique entre 2011 e 2015, Mogens Pedersen, consultado no âmbito desta investigação, assegurou que o gigante do transporte marítimo há muito sabe do risco de os seus porta-contentores serem usados para transportar madeira ilegal de Moçambique para a China.

Dois dos exportadores que enviaram madeira “tropical” para fora de Moçambique através dos navios MAERSK DOUALA e MAERSK NACALA foram entretanto apanhados a infringir as leis moçambicanas em matéria de madeira.

Os cientistas estimam que a desflorestação – causada tanto pelo comércio ilegal de madeira como pela produção de carvão vegetal – tornou Moçambique mais frágil aos ciclones, o Governo estima em milhares de milhões de euros as perdas devido a esse comércio e instituições como o Instituto de Estudos Sociais e Económicos, de Moçambique, alertam que os fundos obtidos ajudam a financiar ataques dos rebeldes islâmicos, como os ocorridos desde 2017 em Cabo Delgado. (JN)

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