Dois anos após o Acordo Geral de Paz, realizaram-se as primeiras eleições gerais multipartidárias. Foi um marco que prometia liberdade de escolha e pluralismo. De lá para cá, surgiram vários partidos políticos com propostas diferentes de governação. No entanto, entre 1994 e os dias de hoje, nenhum desses partidos teve a oportunidade real de assumir o poder. Repetidamente, a oposição denuncia manipulações e fraudes eleitorais — como se viu, mais uma vez, nas vergonhosas eleições de 9 de outubro de 2024. Digo isto como qualquer cidadão comum poderia dizer, com base no que os nossos olhos veem e evidências comprovam.
A palavra independência, quando observada na sua construção linguística, é clara: negação da dependência. Contudo, se formos provocadores — e temos de ser —, na língua inglesa, o termo independent pode esconder uma ironia: in-dependence, ou seja, “dentro da dependência”. Isto leva-nos a refletir se, de facto, deixámos de ser uma colónia, ou se apenas nos tornámos parte de uma estrutura mais sofisticada de dominação — desta vez, travestida de soberania.
Ainda dentro desta análise de vocábulos, há uma expressão muito conhecida entre nós Moçambicanos: “PARA O INGLÊS VER”. Trata-se de algo feito apenas para aparentar, para mostrar a quem está de fora, enquanto a realidade interna continua mergulhada no caos. Hoje, como de costume, as televisões e mídias vão exibir melhorias, vão desfilar promessas e apresentar supostos avanços. Mas nós, o povo, sabemos que por trás dos panos pouco ou quase nada mudou. E dizemos isso não por simples crítica, mas por amarga experiência.
Esperava-se que, após a independência, valorizado o esforço dos nossos herois nacionais, moçambicanos olhassem uns para os outros com espírito de solidariedade e compromisso com o bem comum. Que os governantes olhassem com prioridade para as necessidades das pessoas. Mas, infelizmente, não foi isso que se concretizou.
Com transporte, educação, saúde, alimentação, energia, água, cada vez mais caros, a verdade é que estávamos, de certa forma, mais conscientes na colonização do que agora, nesta suposta independência. Pelo menos sabíamos quem era o opressor. Hoje, ele veste-se como nós, fala como nós, mas age absolutamente contra nós. Os governos, ao invés de melhorar as condições de vida, tornaram tudo mais caro, mais inacessível, mais excludente. Investir num negócio, ter uma casa própria até aos 30 anos ou simplesmente ter saúde digna são sonhos distantes para a maioria dos donos da pátria.
E pior ainda: o Ocidente continua a explorar os recursos africanos com a conivência dos próprios governantes. Oferece-nos “vias de desenvolvimento” que eles próprios desenharam — e que, em vez de nos levantar, nos enterram ainda mais na miséria e na dependência.
Enquanto isso, uma minoria familiar vai acumulando décadas de poder e influência, onde empresas em Moçambique e estabelecimentos comerciais pertence á estrangérios, os jovens coleccionam experiências de desemprego, frustração e falta de esperança, com a ideia de sair de Moçambique e não mais regressar. O ensino é de baixíssima qualidade, os formados tornam-se desempregados crónicos, e o valor do “Metical” a deteriora-se dia após dia. Os jovens não conseguem sequer fazer investimentos básicos, e os estudantes negros ainda precisam mendigar bolsas de estudo nos brancos para se formarem, porque a melhor educação de Nacional não oferece a qualidade necessária.
Se isso ainda nos acontece, é porque o nosso senhor — com todo o simbolismo que esta palavra carrega — ainda é branco. E não falo aqui apenas de cor de pele, mas de estrutura de pensamento, de domínio económico e de influência política estrangeira.
É evidente, portanto, que precisamos de uma mudança profunda no modelo de governação. Não é apenas uma questão de sigla partidária — FRELIMO ou outro — mas da ausência de resultados satisfatórios, da falta de compromisso real com as pessoas. O governo, que deveria servir o povo, parece não ter tempo para olhar para ele. Não investe com seriedade nas suas reais necessidades.
Se quisermos, de facto, reduzir os assaltos, os roubos e os assassinatos, devemos começar por alimentar as pessoas. Porque o que fomenta a criminalidade não são ideologias, mas sim as barrigas vazias.
A verdadeira INDEPENDÊNCIA
A verdadeira independência não se mede pela bandeira que se levanta ou pelos discursos que se fazem, mas sim pela forma como o povo vive. Por isso, neste 25 de junho, em vez de apenas celebrar, é urgente refletir. A independência precisa deixar de ser uma palavra bonita nos livros, jornais e televisões, mas tornar-se realidade nas mesas, nas escolas, nos hospitais, na liberdade de expressão e nos corações dos moçambicanos. É isso que as pessoas precisam, uma vida digna.
Enquanto isso não acontecer, estaremos apenas dentro de uma nova forma de dependência, deixando para atrás a ideologia e suor de Mondlane, Machel, Urias Simango e outros.