O drama vive-se no quarteirão 110, pertencente ao bairro Hulene “B” pertencente ao distrito municipal KaMavota na Cidade de Maputo. A situação coloca em risco a saúde e o bem-estar dos moradores do bairro com maior destaque para as crianças.
Os afectados pelas chuvas do ano 2023/2024 contam que perderam tudo que tinham nas suas residências o que aumenta as dificuldades diárias das famílias. Apesar das condições desafiadoras do bairro, a nossa reportagem constatou que ainda existem moradores que permanecem e tentam levar uma vida normal dentro das condições existentes.
Em entrevista ao Integrity Magazine, Fátima Muizine, viúva e mãe de quatro filhos, dos quais dois menores, moradora de Hulene “B”, há mais de 20 anos, surpresa de que a zona onde reside há décadas pudesse inundar, conta como tudo começou.
“Não contava que a água pudesse chegar a minha casa, naquele dia vivemos momentos de pânico. Começou a chover do nada, mas de repente a água já chegava até aos joelhos”, contou, acrescentando que só sobreviveu graças à ajuda de familiares próximos.
Fátima explica que desde essa altura a água nunca mais secou com as chuvas constantes que se seguiram foi perdendo os bens que tinha, desde alimentos, electrodomésticos, mobílias, vestuário até a documentação pessoal dos seus filhos.
Para ela, uma das principais perdas foi a sua fonte de renda, o que contribuiu para o agravamento da situação financeira da sua família, afinal de contas ela é responsável por garantir o sustento dos seus filhos. A nossa fonte conta que com as enchentes na sua residência, toda a clientela sumiu.
“Eu vendia tomate aqui em casa, mas agora não vendo mais porque as pessoas não compram, a minha casa está cheia de água e as pessoas temem pela sua saúde. Os meus filhos também não
Histórias como da Fátima Muizine repetem-se por aquele bairro. Os moradores dizem estar saturados com o problema que persiste há quase um ano, ainda assim afirmam que não abandonaram as casas até que sejam reunidas as devidas condições para o reassentamento.
“Construímos essa casa com muito suor, compramos bloco por bloco e não vamos aceitar sair dessa casa para viver numa ‘tendinha’ sem as devidas condições’’, disse Yura Langa em representação de outra família que também perdeu tudo o que tinha.
“Como jovem estudante perdi toda a matéria e não foi fácil recuperar, os cadernos foram com a água. Meu pai teve que fazer alguns cortes nas despesas por conta da renda que deve ser paga’’, explicou a fonte.
Moradores afectados clamam por soluções para o seu dilema
Dada a situação, a falta de terrenos para reassentamento, os moradores do quarteirão 110 clamam por soluções. Das várias apresentadas considera-se urgente a viabilização da passagem das águas.
“Pedimos ao Conselho Municipal que traga soluções e não falsas promessas, deve-se instalar bombas de escoamento de água” afirmou Laércio Muchanga contando que não aguenta mais aguentar viver naquelas condições.
No quarteirão em alusão são frequentes queixas de doenças típicas da época chuvosa com destaque para a malária. É neste sentido que também pedem redes mosquiteiras e outros produtos que possam proteger-lhes das doenças.
Como as soluções de entidades competentes nacionais não chegam os jovens deste bairro tiveram a ideia fazer uma ponte para que as pessoas tivessem como se deslocar de um lugar para o outro, é assim que conseguem ter acesso a outras zonas.
Contactado o Município da Cidade de Maputo para perceber o tipo de assistência prestada a essas famílias ou em situação do género, a edilidade mostrou-se relutante a prestar declarações acerca do assunto, prometendo entrar em contacto, mas mesmo com insistências do nosso jornal, nunca o fez.
Especialistas alertam para risco a saúde e ao meio-ambiente
Em conversa com o ambientalista Elvino Litsure, sobre Hulene “B”, ele afirmou que as enchentes são um grande problema para o meio-ambiente como para saúde pública, dependendo da área onde as águas estão estagnadas. Neste caso concreto o problema torna-se maior por ser numa zona urbana e próxima a um aterro sanitário.
“Estas águas vão arrastando resíduos sólidos e não só, dejectos humanos e de animais e não encontram aquilo que é uma bacia onde essa mesma água possa ser escoada, acabam ficando por um longo período que acaba propiciando também a questão da proliferação dos resíduos”, salientou o ambientalista.
O ambientalista acrescentou ainda que quando se verifica uma situação desta natureza as consequências podem ser trágicas, razão pela qual defende ser preciso deslocar as pessoas para um local onde existem condições limpas para que a população possa retomar as suas actividades diárias normalmente.
“Tu não vais retirar alguém do bairro Hulene para ires colocar num bairro de expansão, onde a própria via de acesso é caótica, uma pessoa já acostumada a ficar mais próximo da cidade para se deslocar numa zona como esta será difícil e maior parte da população moçambicana vive do seu auto-sustento, então é impossível”, referiu Litsure.
O especialista acrescentou que a edilidade deve ter um posicionamento ambiental virado a questão do saneamento do meio ao nível urbano, pois tendo isso em prática evitaria que situações do género se repetissem noutras zonas.
Por outro lado, a médica Stefânia Mavale alertou para a proliferação de doenças devido ao ambiente em que os moradores de Hulene “B”, concretamente os afectados pelas inundações, se encontram. Dentre várias doenças ela destaca diarreia, hepatite A, cólera, leptospirose e outras respiratórias.
“A humanidade elevada e o mofo aumentam casos de asma, bronquite e outras infecções. A contaminação da água e dos alimentos afectados por esgotos e químicos arrastados pela enchente e o lixo acumulado viram ninhos de roedores e outros animais, estes também contribuem para proliferação de doenças”, alertou.
Mavale explica que as doenças podem ter um efeito a longo prazo, causando outras sequelas, por isso que ela destaca a necessidade de ter cuidado com os utensílios domésticos e os alimentos. (INTEGRITY)