Portanto, falando ao Integrity Magazine, sobre as soluções para se colmatar essa situação, o académico Silvério Ronguane defende que a solução passa por um diálogo estruturado entre todas as partes envolvidas com o governo organizando, e não pela imposição unilateral das taxas. Para ele, é necessário um entendimento sobre a racionalidade desses custos e sobre como foram estabelecidos.
“Todos os problemas humanos se resolvem na base da negociação”, afirmou Runguane, sublinhando que essa deve ser a abordagem para o problema das portagens. E considera que a questão deve ser analisada em duas dimensões: primeiro, no contexto dos protestos pós-eleitorais, onde os cidadãos têm demonstrado insatisfação geral com o sistema, movidos por Venâncio Mondlane; e segundo, na problemática específica das portagens, que passaram a ser cobradas em estradas anteriormente gratuitas.
O académico recordou que o Estado assinou contratos com concessionárias privadas para a gestão dessas infraestruturas, e que, em alguns casos, os custos deveriam ser suportados pelo governo e não pelos utilizadores. No entanto, a realidade tornou-se diferente: os cidadãos foram confrontados com cobranças inesperadas, sem que houvesse uma explicação clara sobre o que motivou essa mudança. “O utilizador nunca vai entender o que mudou para ele começar a pagar por uma estrada que sempre usou sem custos”, enfatizou.
Além da falta de clareza sobre os contratos assinados, Ronguane apontou uma disparidade nos valores cobrados. Comparou o caso dos utilizadores que percorrem 40 quilómetros até Moamba, pagando 40 meticais, com os que percorrem apenas um ou dois quilómetros, pagando o mesmo valor. “Isso não faz sentido. É injusto e explorador”, declarou. Para este, é necessário estabelecer critérios objectivos que justifiquem os valores aplicados e garantam que os custos sejam proporcionais à distância percorrida.
O académico sugeriu que uma solução viável para este impasse seria a criação de um espaço de diálogo que reunisse utilizadores, comunidades locais, o governo e a concessionária TRAC. “Se tivermos a associação dos utilizadores, se tivermos a TRAC, se tivermos o Governo, se tivermos as comunidades por onde essas estradas passam e sentarmos na mesma mesa, podemos encontrar uma saída”, argumentou. Segundo ele, essa conversa permitiria esclarecer por que alguns condutores pagam valores elevados por percursos curtos, enquanto outros pagam proporcionalmente menos.
Outro ponto crítico levantado por Ronguane foi o impacto social das portagens. Para ele, essas infraestruturas criaram novas barreiras para as populações locais, afectando, inclusive, a dinâmica familiar. “Essas portagens dividem famílias. Alguém que tem os pais do outro lado, tem a sua família do outro lado, tem uma esposa do outro lado, para visitar essas casas tem custos adicionais. Então, significa haver um problema que a estrada foi criar àquelas pessoas, mas um problema que efectivamente não existia”, explicou. Isso, segundo Runguane, demonstra que a introdução dessas taxas não considerou os impactos reais na vida das pessoas.
No entanto, o académico deixou claro que a questão não se resume apenas à redução dos preços. “Eu não digo que a solução seja simplesmente baixar os valores. Antes de se chegar a essa conclusão”, afirmou. Para ele, o problema não está apenas no custo em si, mas na forma como ele foi imposto sem qualquer consulta aos utilizadores.
Além disso, Ronguane criticou como o governo lida com os protestos contra as portagens. Em vez de abrir um canal de diálogo, as autoridades respondem com repressão. O Estado está usando a polícia e as forças armadas para lidar com a situação, mas não está conversando com as pessoas que se manifestam, apontou.
Na sua visão, o governo trata a questão de forma selectiva, priorizando conversas com políticos e empresários, enquanto ignora aqueles que realmente enfrentam as consequências das portagens. “Parece que o nosso diálogo escolhe caras, escolhe aqueles que não são os afectados”, criticou.
Diante desse cenário, Ronguane defendeu que o governo deve assumir a responsabilidade de organizar um diálogo amplo, que envolva todas as partes interessadas. Sublinhou que o Estado não deve tomar partido, mas sim garantir que as diferentes vozes sejam ouvidas e que um consenso seja alcançado. “O governo não deve ser parte no conflito, mas sim intervir para facilitar um entendimento entre os envolvidos”, afirmou.
O académico também questionou a lógica de o Estado mobilizar recursos públicos, como a polícia e as forças armadas, para proteger interesses privados. Para ele, essa postura levanta dúvidas sobre o papel do governo na defesa do interesse colectivo. “O Estado, sim, existe sendo chamado para intervir para as partes entenderem. Não deve ser parte”, ressaltou.
Para resolver este impasse, Ronguane sugeriu ainda que se avaliasse a possibilidade de modelos diferenciados de cobrança, como passes especiais para utilizadores frequentes. Este também argumentou que motoristas que utilizam as estradas diariamente não deveriam pagar os mesmos valores que aqueles que as usam esporadicamente. (Bendito Nascimento)