Com 51 anos, careca brilhante e um sorriso que parecia colado com cola-fria, ele enfrentava uma plateia que já o julgava antes mesmo de abrir a boca.
Por: Bendito Nascimento
Donzelino era o retrato do partido que o criou: rígido, bem alinhado e profundamente grato. Ele ostentava uma aparência jovial, mas carregava no bolso um bilhete vitalício da política envelhecida, aquela que fraudou eleições, esmagou votos e plantou presidentes como quem planta cajueiros estéreis. O próprio chefe de Donzelino, o presidente ilegítimo, estava sentado na primeira fila, a assistir à cerimónia com o olhar satisfeito de quem acabara de nomear mais um soldado para defender a fortaleza de papelão que chamam de democracia.
No discurso, Donzelino parecia ensaiado demais. Cada palavra saía como uma canção que já tinha sido mastigada e cuspida por gerações de ministros anteriores. “A juventude é o futuro do país”, dizia ele com um entusiasmo tão artificial que até os microfones pareciam engasgar. “Vamos garantir que os jovens tenham oportunidades iguais, acesso ao desporto e uma representatividade digna!”
A plateia reagia com ironias disfarçadas de palmas. No fundo, todos sabiam que a única coisa igual para os jovens moçambicanos era a desigualdade. As “oportunidades” vinham em forma de gás lacrimogéneo e bala reais, distribuídos pelas mesmas forças que Donzelino, num passado não tão distante, elogiava por “garantirem a ordem”.
Nas ruas, a juventude fervilhava. Eram vozes roucas de tantas manifestações reprimidas, de tantas promessas não cumpridas. “Que juventude é essa que ele representa?” perguntou um jovem com um cartaz que dizia: ’51 não é juventude, é meia-idade’.
Donzelino, no entanto, parecia alheio ao caos que o rodeava. Na sua cabeça, ele era um símbolo da renovação, uma prova viva de que o partido podia se reinventar. Mas as comparações eram inevitáveis. Para os jovens que passavam horas em filas intermináveis à procura de emprego ou oportunidades de estudo, Donzelino era tão útil quanto uma bicicleta sem rodas.
“Este ministro é como um machimbombo velho pintado de novo”, murmurou um manifestante. “Pode até parecer diferente, mas continua a parar nos mesmos lugares.”
O momento mais simbólico da cerimónia foi quando Donzelino prometeu “colocar Moçambique nos lugares cimeiros do desporto”. As palavras, tão vazias quanto o orçamento do ministério, provocaram risos abafados na multidão. Um jovem sussurrou para o colega:
“Lugares cimeiros? Deve ser no campeonato mundial de fingir que se importa.”
A juventude não estava interessada em discursos nem em promessas. Queriam mudanças reais, mas o único movimento que Donzelino parecia oferecer era o de avançar para a próxima fotografia oficial. Ele posava com uma falsa jovialidade, e a encenar um entusiasmo que nem os mais distraídos conseguiam decifrar.
O presidente ilegítimo, no entanto, sorria ao fundo. Para ele, Donzelino era a escolha perfeita: um rosto jovem o suficiente para enganar, mas velho o bastante para obedecer.
E assim, enquanto os jovens marchavam pelas ruas de Maputo, a lutar por um futuro que lhes era roubado diariamente, Donzelino seguia no carro oficial, com ar-condicionado e vidros escuros. Para ele, ser jovem aos 51 anos era mais uma questão de marketing político do que de convicção. Afinal, na política moçambicana, juventude não é uma fase da vida, é só mais uma desculpa para manter o poder nas mãos erradas.