O acesso à terra sempre foi um tema sensível no país. Apesar de a Constituição garantir que a terra é propriedade do Estado e deve ser usada para benefício de todos os moçambicanos, a realidade é marcada por desigualdades no acesso e uso da terra. A ocupação de terras “abandonadas” ou improdutivas reflecte a incapacidade de muitos cidadãos, especialmente jovens, em encontrar soluções para a falta de habitação ou condições de vida dignas. No entanto, essa dinâmica também é impulsionada por motivações econômicas, com indivíduos ou grupos buscando obter lucros através da venda irregular de parcelas de terra.
Este fenómeno de ocupações de terras pode ter elementos de oportunismo e desordem social semelhantes. Esses episódios de invasão de propriedades, sejam públicas ou privadas, mostram frustrações profundas e uma falha sistêmica das autoridades em prevenir tais actos ou em mitigar as causas subjacentes, como o desemprego, a pobreza e a desigualdade.
A teoria de que as ocupações podem ser uma estratégia de distração política não deve ser descartada. Em períodos de tensão política, regimes autoritários frequentemente empregam táticas para desviar a atenção pública de protestos ou demandas populares. A chegada de figuras opositoras de destaque, como Venâncio Mondlane, pode ter sido vista como uma ameaça à estabilidade do regime, o que teria incentivado acções destinadas a fragmentar a mobilização popular ou a criar uma crise paralela que ocupasse a opinião pública.
O comportamento passivo das autoridades diante das invasões de terra levanta sérias questões sobre a governação e o respeito pelo Estado de Direito. Se por um lado o governo condena as acções publicamente, por outro, sua inação sugere conivência ou, pelo menos, uma falta de capacidade para lidar com a situação. Esse cenário cria um precedente perigoso, onde a usurpação de terras pode ser normalizada e incentivada pela percepção de impunidade.
A ocupação irregular de terras tem implicações econômicas, sociais e políticas graves. Pode gerar conflitos entre os usurpadores e os legítimos proprietários, prejudicar a confiança no sistema jurídico e inviabilizar investimentos no sector agrário e imobiliário. Além disso, a desordem social gerada por essas campanhas aprofunda a crise de governança e acentua as desigualdades.
O fenômeno das invasões de terra em Moçambique é um sintoma de problemas mais profundos, incluindo má gestão fundiária, pobreza estrutural e tensões políticas. É urgente que o governo tome medidas firmes para resolver as causas subjacentes, garantindo o acesso equitativo à terra, fortalecendo o Estado de Direito e promovendo o diálogo social para evitar que tais práticas se tornem recorrentes.
Ao mesmo tempo, a sociedade civil precisa estar vigilante para garantir que esses actos não sejam instrumentalizados como ferramentas de manipulação política. Afinal, “algo não está bom no solo pátrio” – e cabe a todos buscar soluções para sanar as feridas do passado e construir um futuro mais justo para todos os filhos desta pátria amada. (Nando Mabica)