A afirmação baseia-se no facto de que a Kenmare junto da população apresentou total apoio, incluindo recursos financeiros, ao governo, mas este não construiu a tão esperada infraestrutura.
Estas reacções surgem depois do assalto às instalações da Kenmare pelos residentes de Topuito que culminou com a assinatura de um novo acordo para a edificação da ponte que não avança há mais de dez anos. Pelo que apuramos esta não foi a primeira vez que um compromisso do género foi alcançado.
Em 2016 a Kenmare e a Administração Nacional de Estradas (ANE) assinaram um memorando de entendimento (MdE) que visava materializar a construção da infraestrutura. Ficamos a saber que do acordo firmado a mineradora disponibilizaria três milhões de dólares. Por outro lado, a ANE responsabilizou-se em arranjar o valor remanescente, três milhões, para financiar a ponte, no entanto não aconteceu e nem se quer deu satisfação.
“A ANE, IP compromete-se a obter o financiamento, através de outros parceiros do Governo e Programas de ajuda ou, se tal não possível, recorrer ao Orçamento Geral do Estado para que a ponte seja construída no calendário programado e sejam respeitados os compromissos com a comunidade”, lê-se no MdE.
Do montante garantido da Kenmare três milhões foram subtraídos do valor destinado às acções de responsabilidade social, ou seja, a população também se mostrou disponível a comparticipar na construção da ponte.
“A comunidade tirou também três milhões de dólares americanos. Ela tinha um número de dez ou oito actividades por realizar, optou em diminuir o tipo de actividade, deixaram de fazer o que queriam para priorizar a construção da ponte”, contou Marracuene Abacar, ponto focal das Organizações da Sociedade Civil em Larde.
Regina Macuácua, responsável pela área social da mineradora confirma a disponibilização dos fundos assim como a cedência do valor da comunidade, mas explica que ainda não foram canalizados ao governo tal como se propala.
“Não há nenhum valor que foi entregue ao governo. O compromisso foi no sentido, de que o valor que nós contribuímos anualmente para a implementação de projectos sociais, 2 milhões de dólares seriam retirados e usados para a construção da ponte”, esclareceu.
A responsável pela área social da Kenmare acrescenta que o acordado foi que quando estivessem disponíveis o fundo vindo do governo se iniciaria a construção, mas até a data o governo não mobilizou os três milhões combinados da sua participação.
Segundo os moradores de Larde e activistas sociais de Nampula, esta atitude e outras fizeram transparecer que não havia interesse em construir a ponte pois vezes sem conta foram propostas soluções, ao alcance do governo, para materializar o projecto, mas este sempre rejeitou.
“Nós condenamos o governo central, porque esses contratos foram feitos a nível central. A empresa até chegou a se prontificar em dar dinheiro em forma de dívida para pagar o valor da construção, mas houve recusa do governo”, disse Abacar explicando que o governo dizia nós vamos fazer, mas nunca fez.
Por seu turno Regina Macuácua afirma que se dependesse da Kenmare já teriam construído a ponte. Aliás, confirmou que tentaram emprestar o valor ao governo, mas não tiveram sucesso. Nesse sentido, orienta o governo a mobilizar os fundos necessários para o início das obras.
Do assalto a Kenmare às novas negociações que ainda não avançaram
A população de Larde vendo que o projecto não iniciava sempre procurou esclarecimentos tanto da Kenmare assim como do governo, mas estes nunca foram atendidos se não com promessas de que em breve far-se-ia a construção.
Conta-se que já houve tentativa de negociar com a empresa para a edificação da tão almejada ponte pois isto facilitaria a circulação de pessoas e bens daquela região o que permitiria melhoria da qualidade de vida da população uma vez que com a infraestrutura poderiam surgir outras oportunidades de trabalho e negócios para os moradores.
Depois de tantas tentativas falhadas, os residentes de Topuito viram nas manifestações de reivindicação dos resultados eleitorais uma oportunidade para reivindicar pela ponte.
“E a comunidade, por sua vez, pensou em negociar, mas nunca teve espaço, tentou chegar lá e não conseguiu, então aproveitou a oportunidade de usar a manifestação. Para dizer que não foi um assunto político, mas sim foi a fúria da população, foram dizer, já chega de promessas”, conta Abacar.
O Director-Geral da Kenmare, Higino Jamisse reconheceu a legitimidade das reclamações da população e assinou um documento no qual prometia iniciar novas negociações para construção da ponte na segunda-feira (9 de Dezembro), mas isso não aconteceu.
Regina Macuácua, da Kenmare, disse que esperaram pelos representantes da comunidade, mas estes não compareceram, por sua vez os activistas que acompanham o processo de perto explicam que não constitui verdade.
“Na segunda-feira (09.12) os representantes da comunidade não vieram, eles adiaram e pediram que assim que estivessem organizados comunicassem quando haveriam de vir para continuar as negociações”, afirmou Regina.
“Não é verdade, a comunidade é interessada no processo, como é que não viriam? O que acontece é que o processo foi encaminhado ao governo e estes disseram que não podem avançar porque o acordo foi alcançado coercivamente”, contrapôs Abacar.
Até ao fecho desta reportagem as novas negociações ainda não haviam começado, apenas prevaleciam acusações de não haver interesse em prosseguir com o assunto.
Sociedade Civil considera legítima a reivindicação da comunidade de Topuito
Ouvida a Associação Solidariedade Moçambique (Soldmoz) que acompanha o processo desde o início, entende que as preocupações apresentadas pelos residentes de Topuito merecem ser atendidas uma vez que foi obrigada a destruir o Monte Filipe, um símbolo cultural e tradicional para a comunidade.
António Mutoua, Director executivo da Soldmoz afirma que todo processo ficou desordenado com a saída de Borges Rupia do cargo de Administrador do distrito.
“Nós como organização da sociedade civil, como não existe um interlocutor válido, tentamos seguir o assunto. Ficamos sem saber com quem temos que discutir os assuntos. Se é Secretário de Estado, ou é governador. Nunca tivemos acesso a essa agente para voltarmos a falar do Monte Filipe”, elucidou.
Depois da assinatura dos MdE, Mutoua conta que só ouviram falar que a empresa entregou o dinheiro ao governo por duas vezes e o mesmo nunca se fez sentir no plano discutido. Contudo saúda a abertura da empresa em avançar com o projecto.
Mutoua sugere que o governo não intervenha no processo de construção uma vez que existe vontade da Kenmare e disponibilidade para avançar com a construção da ponte.
A nossa equipa de reportagem contactou o governo de Larde, incluindo o antigo administrador, que na altura assinou o MdE, e a Secretária Permanente da Secretaria Distrital, para ouvir a sua posição sobre o assunto, mas não teve sucesso.
As antigas e as novas promessas não cumpridas pela Kenmare em Topuito
A exploração dos recursos minerais em Larde, pela Kenmare, foi condicionada pela população, ou seja, queriam ver a sua comunidade a desenvolver uma vez que a empresa lucraria com a mineração na mítica zona do Monte Filipe.
Na altura do combinado apenas foi feita uma cerimónia tradicional e construção de uma residência para o régulo local, por forma aos exploradores não sofrerem represálias dos espíritos que habitavam no Monte Filipe.
Uma das condições impostas foi a construção de uma via asfaltada do troço que liga Nampula a Larde, passando por via Chalaua, um posto administrativo do distrito de Moma, incluindo a ponte.
Combinaram reassentar a população e dar novas terras na zona de Morrola e a expansão da rede eléctrica bem como comprar uma viatura para o régulo, tudo isso a população diz que não foi cumprido as antigas assim como as novas, com excepção da cerimónia tradicional e a construção de uma casa para o régulo. (Ekibal Seda)