O evento realizado na Quarta-feira (04 de Dezembro) focou-se nas recentes eleições gerais em Moçambique, destacando as questões de liberdade, transparência e justiça que marcaram o processo eleitoral.
O sociólogo Luca Bussotti, um dos painelistas, afirmou que a União Europeia foi “pega de surpresa” pelos acontecimentos eleitorais em Moçambique. Segundo ele, a reação da comunidade internacional, especialmente da União Europeia, é difícil de compreender, visto que há mais de dois anos já existiam alertas sobre o ambiente político do país. “Não é uma crise do momento, mas há pelo menos dois anos que existe este movimento, povo no poder, etc. E, ainda assim, a União Europeia parece ter ficado surpresa”, afirmou Bussotti, criticando a falta de preparação e resposta clara por parte da União Europeia.
Bussotti também apontou a falta de liderança estável na União Europeia como um factor agravante. A eleição recente de Ursula von der Leyen para a presidência da Comissão Europeia, segundo ele, ocorreu em um momento em que o governo da União Europeia não estava funcionando plenamente. O sociólogo também destacou a divisão interna da União Europeia, mencionando um desacordo sobre o financiamento da missão militar de apoio ao Ruanda, no qual países como Alemanha, Suécia e Bélgica se opuseram, enquanto Itália, França e Portugal apoiaram o projecto. Para Bussotti, a posição desses países foi influenciada por interesses econômicos no sector de gás de Moçambique.
Em resposta à alegação de Bussotti, Manuel de Araújo, candidato para governador da província da Zambézia e ex-candidato à Assembleia da República, desmentiu a ideia de que a União Europeia tenha sido pega de surpresa.
De acordo com Araújo, desde Abril e Maio deste ano, ele já havia alertado a União Europeia sobre os riscos eleitorais. “Eu não sou bruxo, mas já participei de eleições desde 1994 e, a partir dessa experiência, pude prever o que ia acontecer”, disse Araújo, acrescentando que ele próprio se deslocou para Maputo, Londres e Washington para alertar sobre o que estava por vir.
Araújo criticou a União Europeia por não ter dado atenção adequada aos sinais claros de que as eleições em Moçambique seguiram o mesmo padrão das eleições anteriores, nas quais a Frelimo tem prevalecido.
Para Araújo, a alegação de surpresa por parte da União Europeia é “difícil de engolir”. Este, sugeriu que, ao invés de ignorar os alertas, a União Europeia deveria ter tido uma postura mais proativa, considerando a tendência histórica de manipulação eleitoral por parte da Frelimo. “Eu já sabia o que ia acontecer, e foi exatamente o que aconteceu. A União Europeia deveria ter estado mais atenta e actuado de forma mais assertiva”, concluiu.
Bussotti também abordou a relação geopolítica entre os países da União Europeia e Moçambique, apontando os interesses econômicos que influenciaram a decisão de apoiar a missão militar no Ruanda. “Portugal, França e Itália têm investimentos significativos em Moçambique. A Galp, por exemplo, tem poços de gás, e a França tem concessões para explorar o gás. Por isso, a decisão de apoiar a missão foi clara”, afirmou Bussotti, explicando que a acção desses países tem uma forte ligação com seus interesses no sector energético de Moçambique.
O Webinar, moderado por Álvaro Mendes, CEO da Bem Haja – Construindo Gigantes, gerou um intenso debate sobre o cenário político moçambicano. As divisões dentro da comunidade internacional ficaram evidentes, com alguns países celebrando os resultados eleitorais antes mesmo da confirmação oficial, como foi o caso dos líderes de Angola, Zimbábue, Tanzânia e da China. Esse apoio antecipado levanta questões sobre a imparcialidade da comunidade internacional e a eficácia de sua mediação nas questões internas de Moçambique para Bussotti.
Com o Conselho Constitucional ainda sem se pronunciar oficialmente sobre os resultados, as tensões, tanto internas quanto internacionais, continuam a crescer. Portanto, para analistas, as divisões dentro da União Europeia e as diferentes frentes internacionais complicam ainda mais a resolução da crise política no país, tornando incertos os próximos passos para garantir uma solução pacífica e democrática para a situação. (Bendito Nascimento)