Ao invés de se preparar para deixar o Palácio da Ponta Vermelha sem vukuvukus (agitações ou desordens), o PR decidiu ontem nomear um novo Procurador-Geral da República, uma medida que gera grande perplexidade no atual contexto político.
Em paralelo, o Ministro do Interior declarou que o governo “usará todos os meios para garantir o funcionamento normal das instituições”. No entanto, sabemos bem o que “TODOS OS MEIOS” significa no contexto moçambicano. Enquanto isso, o Conselho Constitucional (CC) convocou as câmaras de televisão para exibir publicamente um alegado processo de “confronto de actas e editais disponibilizados pela CNE e pelos partidos políticos” – o que não passou de um espetáculo degradante, uma autêntica pouca vergonha.
A Renamo, por sua vez – ainda que cúmplice, em vários momentos, da Frelimo no modelo que hoje configura o CC e a CNE – juntamente com o MDM, propõe a anulação das eleições como forma de resolver o impasse pós-eleitoral. Eleições, diga-se, em que ambos os partidos foram amplamente suplantados pelo “ascendente” partido PODEMOS e pelos “Ventos de Mudança da Sétima Geração” – VM7.
Estas são apenas algumas das mais recentes notícias que ilustram o cenário político moçambicano. Ao observarmos tal panorama, torna-se evidente a degeneração (Trótski) da Frelimo e, por consequência, do regime autocrático que este partido sustenta, caracterizado por uma série de práticas que violam os mais elementares princípios de um Estado de Direito. Entre essas práticas estão:
As execuções extrajudiciais, que resultam na eliminação física de opositores sem julgamento, em um país que, teoricamente, não adota a pena de morte e é um Estado democrático; A tortura, tanto física quanto psicológica, utilizada para silenciar qualquer forma de dissidência, enquanto as prisões arbitrárias têm como único objetivo intimidar ou punir críticos do regime; O desaparecimento forçado de indivíduos, sequestrados sem que suas famílias sejam informadas ou tenham qualquer prestação de contas; A censura e o controle da informação, amplamente empregados para sufocar a liberdade de expressão; O uso das forças armadas contra a população civil em manifestações; A concentração de riqueza e recursos nas mãos de uma elite governante, que explora a população e saqueia os recursos naturais, como o gás em Cabo Delgado, sem que haja um retorno significativo para a sociedade.
Ademais, a insistência na narrativa de que uma suposta “mão externa” estaria a fomentar o caos através da juventude que ousa questionar as incongruências e mentiras do regime é um expediente desgastado. Curiosamente, esquece-se que esta mesma Frelimo usou métodos similares contra o regime colonial português.
Há ainda o temor de que esta narrativa seja utilizada para justificar restrições severas às organizações não governamentais (ONGs), às organizações da sociedade civil (OSCs) e aos movimentos sociais, como, por exemplo, a “geração 18 de março” – uma prática comum em autocracias. Não é necessário ser profeta ou “nhamussoro”, tampouco um “arauto” de maus agouros, para reconhecer que os sinais do presente prenunciam tempos ainda mais difíceis.
Levando em consideração, no mínimo, o brutal episódio das 25 balas contra Elvino Dias até o ataque bárbaro de um blindado militar contra uma jovem mulher civil e indefesa, o cenário atual pinta um quadro desolador. A Frelimo, ao violar e tentar aniquilar o contrato social – corporificado na Constituição da República –, emerge como a principal causa destes tempos difíceis.
É imperativo, portanto, que a atenção não se limite às reações dos “ventos/movimentos emergentes”, como os “Ventos da Sétima Geração”. Apesar das suas falhas – que não precisamos ir a Amsterdã (Holanda) para “conversar” com Spinoza (Tratado Teológico-Político) e compreendê-las (não as justificar) –, a prioridade deve ser compreender e combater a verdadeira causa das adversidades. Ao erradicá-la, talvez consigamos superar este alto-mar (Nyerere) e deixar para trás os dias difíceis que enfrentamos. Contudo, receio profundamente pelos acontecimentos que se desenrolarão nas próximas horas ou nos próximos dias. A previsão de algo positivo, infelizmente, parece uma miragem.
Phatima Vilankulu Khosa