Aguardei em silêncio a sua implementação, que ocorreu vários meses depois. Fui a último a ser ouvido, em dezembro. Prestei as minhas declarações e juntei a documentação que entendia relevante, apesar de não ter me ter sido apresentado o teor das acusações.
Ao fim do processo foram acusadas 14 pessoas, das quais 9 eram mulheres. A comissão não imputou crimes nem faltas graves a nenhuma das pessoas denunciadas. Que, aliás, não foram identificadas.
Com a recomendação de que as acusações mais graves e de teor criminal fossem encaminhadas para o Ministério Público, a Comissão Independente sublinhou nas suas conclusões:
“Verificou-se que as versões apresentadas por várias pessoas denunciantes e por várias pessoas denunciadas foram em muitas situações incompatíveis entre si, tornando-se, nessas situações, impraticável aferir evidências das mesmas;”
e ainda
“A documentação apresentada e as audições realizadas, tanto de pessoas denunciantes como de pessoas denunciadas, não permitiram esclarecer indubitavelmente a existência ou não da ocorrência de todas as situações comunicadas à CI”.
A Comissão Independente jamais no seu relatório final utilizou o termo “vítimas”, utilizando sempre os termos “pessoas denunciantes” e “pessoas denunciadas”, justamente para garantir que o direito fundamental de presunção de inocência fosse assegurado.
Apesar disso, a Direcção do CES, minutos antes da publicação do relatório, em uma acção política parcial, publicava uma carta pedindo desculpa às vítimas, sem dar o benefício da dúvida aos muitos investigadores visados nesse capítulo. Desde essa publicação que o meu nome tem vindo a ser o mais atingido na guerra mediática que se abriu contra mim, em que o tom é sempre o da condenação prévia.
Assim que tive conhecimento de que o relatório da Comissão Independente havia sido encaminhado para o Ministério Público, requeri, como informei publicamente na única entrevista que dei, ser constituído como arguido e que, devido à minha idade, houvesse uma separação do meu processo relativamente aos demais.
Sempre me predispus a contar a minha versão dos factos perante todas as entidades.
Entretanto, ainda não completamente satisfeitas com as recomendações apresentadas pela comissão independente, as pessoas que me acusavam saíram do anonimato e, em março deste ano, publicaram uma carta na qual me acusavam de ter cometido crimes e faziam exigências ao CES.
Utilizando de um método persecutório, essa carta foi remetida a várias instâncias e a várias universidades com as quais colaboro em Portugal e no exterior. Com excepção de uma instituição, todas as demais disseram que iriam aguardar pelo desfecho do processo na esfera judicial antes de qualquer acção. Infelizmente, a única instituição que não o fez foi o CES.
Assim, na sequência dessa carta, para responder à pressão mediática, o CES decidiu abrir um processo interno. Fui chamado para prestar declarações nesse processo e compareci perante os inquiridores. Disseram-me que queriam apenas levantar questões oralmente numa simples conversa “informal”. Dispus-me a prestar declarações, solicitando que me fossem dadas a conhecer as acusações de que eu era alvo e quem as fazia. Esse direito, que é básico em qualquer direito de defesa, foi-me negado, o que não permitiu o exercício do direito ao contraditório.
Além de ter a minha defesa inviabilizada neste processo interno, a Direcção do CES deu a entender aos associados que eu me havia negado a depor. Essa informação não corresponde à verdade, tal como demonstram a acta da audiência com os inquiridores, à qual eu compareci, bem como as trocas de e-mails entre os meus advogados e os advogados do CES.
Como o CES não me facultou essa documentação, vi-me obrigado a instaurar uma acção judicial contra algumas das assinantes da carta (as residentes em Portugal). Em razão do objectivo de ter acesso formal às acusações que me foram feitas, o processo foi apresentado na esfera civil, por meio da acção de tutela de personalidade. A segunda ação (contra as não residentes) está a ser elaborada e dará entrada nos próximos dias.
A existência desta acção foi pública. Não obstante, os instrutores designados pela direcção do CES não me solicitaram o envio de qualquer documentação.
Entretanto, tive conhecimento de que o processo de averiguações estava concluído, mesmo sem eu ter sido ouvido, nem ter tido a possibilidade de apresentar a minha defesa perante acusações formalizadas.
Em face disto, já não confio que possa haver no CES qualquer tipo de julgamento imparcial e não tenho quaisquer dúvidas de que o objectivo da direcção do CES é (e sempre foi) expulsar-me. Não tenho dúvidas de que a direcção do CES age de modo parcial, com total violação das regras do direito democrático (presunção de inocência), politicamente motivada, devido às disputas internas na instituição, e quer condenar-me publicamente, antes que os Tribunais se pronunciem sobre os casos que estão a ser tramitados.
Não posso pactuar com esta conduta de uma direcção da instituição que criei, a qual, descontente com o relatório da comissão independente, promove o linchamento, sem provas e sem qualquer preocupação com a verdade, de um investigador de renome internacional que, com o seu esforço e dos seus colaboradores, tornou o CES numa das mais prestigiadas instituições científicas do mundo na área das ciências sociais.
Paralelamente, tive conhecimento que aqueles que internamente me apoiavam têm sido silenciados e alvos de perseguição, havendo recusa na publicação de textos e artigos, como nunca havia sucedido na instituição. Isto não é o CES, uma instituição onde antes toda a diversidade de opiniões poderia ser expressa.
Informo, por estes motivos, que em breve serão tornados públicos todos os documentos que sustentam a minha versão dos factos. Faço-o com um misto de tristeza, mas também de alívio, porque não me revejo minimamente na instituição que é hoje o CES. Dedicarei as minhas forças aos processos judiciais e espero que um dia a verdade fale mais alto.
Aos associados do CES e a todos os que querem conhecer a verdade, informo que já está disponível na página https://www.supportboaventuradesousa.com/pt muita documentação pública e mais será incluída uma vez que seja remetida ao tribunal. Deixo a minha palavra de apoio e solidariedade a todos e a todas as colegas que não se reveem na conduta desta direção. Nunca desistam porque a minha renúncia, longe de significar desistência, significa centrar-me noutras lutas bem mais importantes para a universidade, para a ciência e para o mundo.
Abraço e até sempre
Boaventura