Por: Onélio Duarte
A aviação, enquanto sector vital para a conectividade, o desenvolvimento económico e a integração social, tem um papel de destaque em qualquer nação. Em Moçambique, a aviação é especialmente importante, dado o vasto território do país e as suas necessidades de interligação interna e externa. No entanto, apesar da importância da aviação para o país, a sua história e legado permanecem em grande parte ignorados e sem um registo permanente. É incompreensível que, num país com uma empresa aérea nacional, o Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IACM) e Aeroportos de Moçambique, ainda não exista um museu dedicado à preservação e à celebração da história da aviação moçambicana. Enquanto o mundo à nossa volta investe na preservação das suas memórias aéreas, Moçambique parece descurar este património cultural e histórico, comprometendo a educação sobre o sector e o reconhecimento das suas conquistas.
A Falta de Preservação Histórica: O Caso de Moçambique
A ausência de um museu de aviação em Moçambique não é apenas uma lacuna no panorama cultural do país, mas também uma falha na preservação de uma parte importante da sua história. A aviação moçambicana tem raízes profundas, que remontam ao início do século XX, com a chegada dos primeiros aviões e o desenvolvimento do transporte aéreo. A Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), fundada a 26 de Agosto de 1936 (como DETA – Direcção de Exploração de Transportes Aéreos), é um marco nesta evolução, sendo a primeira companhia aérea do país e a única com bandeira nacional.
Apesar desta relevância histórica, não existe, até hoje, uma estrutura que preserve a memória da aviação em Moçambique. Nem a LAM, nem o IACM, nem Aeroportos de Moçambique têm investido de forma significativa na criação de um museu ou de um centro de documentação que dê a conhecer a evolução do sector. A falta de um espaço físico que preserve as aeronaves históricas, os documentos e os registos dessa história faz com que um aspecto importante do património cultural do país se perca, sem ser transmitido às novas gerações.
Além disso, a situação é ainda mais grave quando se observa o destino final das aeronaves obsoletas da LAM. Em vez de serem preservadas como artefactos históricos ou expostas em locais de interesse público, muitas dessas aeronaves são simplesmente desmontadas ou destruídas, sem que haja qualquer explicação clara sobre esse processo. Ao contrário de outros países que preservam as suas aeronaves aposentadas em museus ou cemitérios de aviões, Moçambique parece optar por apagar qualquer vestígio da sua história aeronáutica. Esta falta de transparência e o tratamento indiferente das aeronaves históricas são uma afronta à memória colectiva e ao legado da aviação nacional.
Comparação Internacional: O Valor Cultural dos Museus de Aviação
Em contraste com a realidade de Moçambique, muitos países à volta do mundo têm investido na preservação da sua história aeronáutica através de museus e centros culturais. O Smithsonian National Air and Space Museum, nos Estados Unidos, é um exemplo paradigmático. Este museu é um dos maiores e mais importantes do mundo, possuindo uma vasta colecção de aeronaves e artefactos que ilustram a evolução da aviação, desde os seus primeiros passos até aos feitos mais modernos no campo da exploração espacial. Através dessas colecções, o público pode perceber não só os avanços tecnológicos, mas também o impacto social, económico e político da aviação ao longo das décadas.
Na Europa, o Musée de l’Air et de l’Espace (Museu do Ar e do Espaço) em Le Bourget, França, é outro exemplo de como um museu pode servir de repositório para a história da aviação. Este museu, que alberga mais de 150 aeronaves, incluindo modelos históricos e raros, desempenha um papel educativo importante, atraindo milhões de visitantes todos os anos. Para além de preservar os artefactos, esses museus ajudam a contar histórias importantes sobre a evolução da tecnologia, as relações internacionais e as guerras, entre outros aspectos cruciais.
No continente africano, países como a África do Sul e o Quénia também preservam o seu património aeronáutico com museus especializados. O South African Airways Museum, em Joanesburgo, é um exemplo de como um museu pode ser uma ferramenta poderosa para educar a população sobre a história da aviação no continente africano, particularmente no que diz respeito às contribuições da África para o desenvolvimento desta indústria.
Esses exemplos demonstram claramente que um museu de aviação não é apenas um ponto turístico, mas uma plataforma educativa que permite ao público conhecer o impacto cultural e científico da aviação. A história da aviação deve ser preservada como uma parte vital da memória colectiva de uma nação, contribuindo para o desenvolvimento cultural e educacional da sociedade. Em Moçambique, a falta de um museu de aviação representa uma falha grave nesse sentido, e é um reflexo da negligência do sector público e privado relativamente à preservação desse património.
O Futuro da Aviação em Moçambique: Preservar para Inovar
Criar um museu de aviação em Moçambique não deve ser apenas uma questão de preservar artefactos históricos, mas também uma forma de investir no futuro do sector aeronáutico. Um museu que reúna aviões históricos, documentos e objectos relacionados com a história da aviação em Moçambique poderia servir como um centro de educação e investigação, atraindo estudantes, profissionais do sector e turistas interessados na história da aviação.
Além disso, um museu poderia inspirar as gerações mais jovens a seguirem carreiras no sector da aviação e nas áreas científicas e tecnológicas associadas. Num país como Moçambique, onde o sector aéreo tem um papel central na conectividade e no desenvolvimento económico, é essencial que as novas gerações compreendam a importância da aviação e as suas implicações para o país.
A criação de um cemitério de aviões, onde aeronaves obsoletas pudessem ser preservadas ou até restauradas, poderia ser uma outra forma de valorizar o património da aviação nacional. Este tipo de espaço não só preservaria as aeronaves, mas também poderia ser integrado num projecto turístico, gerando uma nova fonte de receitas para o país.
Conclusão: A Urgência de Preservar o Legado da Aviação
A falta de um museu de aviação em Moçambique é uma falha grave na preservação da história e do património do país. A Linhas Aéreas de Moçambique, o Instituto de Aviação Civil de Moçambique e Aeroportos de Moçambique devem assumir a responsabilidade de investir na criação de um espaço que celebre a história da aviação moçambicana. Não podemos permitir que as futuras gerações cresçam sem conhecer o legado que a aviação deixou no país, nem que as nossas aeronaves históricas sejam destruídas sem um propósito claro.
Moçambique tem todas as condições para seguir o exemplo de outros países e criar um museu que resgate este património, e ao mesmo tempo, contribuir para o desenvolvimento do sector e do turismo. A aviação é uma parte fundamental da nossa história, e é urgente que comecemos a preservá-la e a promovê-la como parte do nosso legado cultural e educacional. – ONÉLIO DUARTE