Caos pós-eleitoral (04): Advogados e defensores de direitos humanos condenam mortes nas manifestações

INTEGRITY-MOÇAMBIQUE, 11 de novembro de 2024-Vários defensores de direitos humanos e advogados consideram assombroso o número de vítimas mortais, baleadas pela Polícia da República de Moçambique (PRM), nas manifestações pós-eleitorais. Para eles não se justifica o uso de balas reais em greves pacíficas e contra indivíduos indefesos.

Em conversa com a Integrity os nossos entrevistados defenderam que deve haver responsabilização dos infractores e compensação às famílias das vítimas por terem perdido os seus entes queridos injustamente durante as manifestações.

No entender de Mirna Chitsungo, defensora de direitos humanos, o uso de violência pelos agentes da PRM em manifestações é um problema antigo e constitui autêntica violação das leis moçambicanas.

“O Estado Moçambicano já há muitos anos vem sendo intolerante para o artigo 51 da Constituição da República que prevê o direito à manifestação, o de ir à rua para reivindicar os direitos. Nós estamos diante de um festival de intolerância política e excesso de zelo por parte da polícia, o que não constitui uma novidade”, condenou.

Já o advogado Victor da Fonseca frisa que há necessidade de as autoridades policiais respeitarem a Constituição da República pois ela enaltece que Moçambique é um Estado de Direito Democrático pelo que deve-se primar pela legalidade respeitando as normas.

“A Constituição em seu artigo 40 faz referência sobre direito à vida. Esse direito à vida não é dado valor quando militares, policiais ou da Unidade de Intervenção Rápida atiram com balas de verdade intencionando tirar a vida das pessoas”, comentou.

Nessas últimas três semanas marcadas por greves, mais de 30 pessoas já perderam a vida, de acordo com a organização internacional Human Rights Watch. A Associação Médica de Moçambique, contabilizou, até o dia 5 de novembro, mais de 100 pessoas alvejadas pela polícia durante as manifestações. Só no dia 7 de novembro, a plataforma de observação eleitoral Decide, registou quatro mortes, 35 pessoas baleadas e 130 detidas.

 Polícia defende aos interesses das elites políticas e não a soberania

Uma das justificações amplamente usadas pela PRM em relação aos baleamentos é o de fazerem em defesa da soberania do estado. No entender da defensora de direitos humanos, o comportamento da PRM sugere que a corporação não está a salvaguardar os interesses dos moçambicanos, mas sim protege os interesses das elites políticas.

“Então eu apelo à polícia para saber que defender a soberania não é ir contra os cidadãos moçambicanos. Defender a soberania é amparar os próprios cidadãos”, afirmou, justificando que devem zelar pelos direitos humanos e não atirar balas reais directamente para os cidadãos.

Habituada com reações similares por parte da PRM a defensora dos direitos humanos prevê um pedido de desculpas ao povo moçambicano vindo do Comandante-geral da corporação, Bernardino Rafael, por isso adianta que não há razões para a polícia desculpar-se diante destas ações pois nota -se claramente a intenção dos disparos.

“Gostaria de dizer também que o comandante Bernardino Rafael, este ano, não vai mais funcionar, chegar em dezembro e pedir desculpas. Eles dão ordens superiores, atiram nos cidadãos para depois se desculpar. Não há mais desculpas para perdas massivas de vidas

Diálogo apontando como caminho para o alcance da estabilidade

Pensando na possibilidade dos cidadãos voltarem a manifestar tendo em conta o anunciado por Venâncio Mondlane, Mirna sugere o diálogo e atitudes pacíficas entre os intervenientes.

“Eu queria apelar para uma ação muito mais pacífica. Já vejo aí o movimento de acadêmicos com intenções claras para a realização de uma conferência de reestruturação do Estado, iniciativas como essa poderiam nos livrar da violência”, exortou.

“Caso Venâncio Mondlane anuncie uma nova saída às ruas, eu gostaria de apelar a PRM a observar os instrumentos legais que regem a sua profissão”, acrescentou.

Para Víctor da Fonseca, sublinhando que Moçambique é um Estado de direito democrático, a solução do problema também reside no diálogo.

“O ministro que sobre-entende a área, devia ter uma conversa de sensibilização com os manifestantes sobre como é que devem proceder. Deveria haver um trabalho em consonância entre a PGR e o Ministério do Interior para evitarmos situações graves”, orientou. (Ekibal Seda)

 

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