Por volta das 9 horas da manhã, o corpo de Elvino Dias, saía da morgue do Hospital Central de Maputo rumo a Igreja Nossa Senhora do Rosário em Laulane, local onde era esperado para o velório.
A Igreja Nossa Senhora do Rosário ficou completamente abarrotada de familiares, amigos, colegas de trabalho e formação, membros de partidos políticos, artistas e outros que lá estiveram para despedir-se de Elvino Dias.
Depois do velório seguiu-se um cortejo fúnebre, rumo ao Cemitério de Michafutene, por várias avenidas e bairros da cidade de Maputo. Por onde a caravana passava, Elvino era aplaudido com cânticos eufóricos nos quais o apelidavam de “o soberano, advogado do povo”.
Em Michafutene mais de uma centena de pessoas o esperava, nas suas intervenções os presentes destacavam a simplicidade que o falecido apresentava na missão que carregou ao longo da sua vida a de defender com justiça e igualdade as comunidades mais desfavorecidas.
Na cerimónia religiosa, dirigida como mandam os ditames católicos, religião por si professada, o Arcebispo da Arquidiocese de Maputo, Dom João Carlos, maestro da missa, disse que nenhuma palavra era capaz de transmitir o sentimento dos enlutados.
“A vida de Elvino Dias foi interrompida de forma tão cruel e inesperada. Estamos materialmente esmagados por este golpe da morte. A violência e a barbaridade que levou a sua vida choca-nos profundamente e faz-nos questionar a presença do mal no meio de nós”, lamentou.
Incitando a reflexão sobre o valor da vida o Arcebispo declarou que Elvino pode não ter sido entendido no seu trabalho como advogado para os mais desfavorecidos. Ainda assim ressalta que ninguém deveria ter tirado sua vida.
“Como advogado trabalhou incansavelmente em prol da justiça, certamente, defendendo os direitos dos mais vulneráveis e empenhando-se na promoção do bem comum, se calhar terá sido por isso, que não foi bem entendido, nem acolhido”, julgou.
“Elvino sempre colocou a justiça no centro das suas acções” defendem amigos e familiares
A família de Elvino Dias frisou que, em vida, ele sempre colocou a justiça no centro de todas as suas acções, visando uma sociedade em que prevalecesse o crescimento e desenvolvimento igualitário.
“A sua busca pela justiça era uma das marcas mais ocultas notáveis da sua vida. Muitas vezes relegou até ao confronto e a segurança familiar, sempre passando muito tempo lutando pela justiça e no compromisso com causas maiores”, contou a família.
Já os amigos destacaram a forma como ele lidava com a vida frisando que antes mesmo de tornar-se advogado já defendia os outros.
“Elvino Jamais hesitou em se posicionar, defendendo incansavelmente um tratamento equitativo e justo. A sua simplicidade e facilidade no trato com as pessoas encantavam a todos”, lembraram os amigos.
Elvino dedicou-se à defesa dos direitos ao serviço da verdade, neste sentido os mais próximos, entendem que o sofrimento do seu desaparecimento físico afectará varias famílias.
Para os amigos e familiares a presença massiva de pessoas na cerimónia fúnebre prova o impacto que ele causou em vida, pelo que no seu entender todos são desafiados a reflectirem seus valores da liberdade, igualdade, democracia e justiça, pelos quais ele tanto lutou antes da morte.
“Elvino Dias, nosso soberano, viverá para sempre nas nossas memórias e nas do povo, enquanto mantivermos vivos os ideais pelos quais ele tanto lutou. Com coragem, determinação e união continuaremos a honrar a sua memória e a sua luta. Até sempre, soberano”, finalizaram.
Partidos políticos defendem que o advogado só queria a voz do povo ouvida
Os representantes do partido PODEMOS e do Candidato Presidencial Venâncio Mondlane, entidades as quais assessorava juridicamente, disseram que a luta de Elvino era pelos outros e não por si.
“Elvino acreditava no Moçambique que os mais humildes e oprimidos fossem ouvidos e respeitados. Sempre usou o seu vasto conhecimento jurídico não para si, mas pelos outros. Incontáveis vezes lutou por aqueles que não tinham voz, por aqueles cujos direitos eram pisoteados, sem esperar nada em troca”, sublinhou o PODEMOS.
Fora isso destacaram que para Elvino as leis não eram apenas um conjunto de normas escritas em papel, mas sim um compromisso ético com o ser humano e a dignidade de cada cidadão moçambicano.
A Coligação Aliança Democrática (CAD) disse estar revoltada com o assassinato pois ele sempre guiou esta formação política em momentos difíceis e de incertezas, contribuindo com soluções justas que reflectiam seu compromisso inabalável com a verdade e justiça.
“Ele não via a advocacia como profissão, mas como uma missão para defender o que é certo e lutar por um país mais justo. Elvino Dias era um ser humano generoso, sua energia produtiva e sua ética para paz encantaram e inspiraram-no a ser um dos melhores líderes”, afirmou Manecas Daniel em representação da CAD.
Para estes partidos a ausência de Elvino será profundamente sentida contudo afirmaram que o seu legado permanecerá vivo em seus corações e na luta pela justiça e democracia que ele tanto defendia.
“Mataram o mensageiro mas não a mensagem” afirma Sociedade civil
A Sociedade Civil teve a mensagem mais aplaudida. Eles intitularam Elvino Dias de um jovem que carregava uma mensagem de justiça e igualdade social cujo assassinato significa apenas a morte do mensageiro e não do conteúdo que ele transportava.
Diante disso prometem dar continuidade das acções deste jovem igual a todos que através da sua simpatia envolvia-se com diferentes povos e defendia a causa de quem quer que fosse.
“Elvino (…) odiava as injustiças e os homens que as fizeram. Era jovem ardente como nós. E perguntamos, mas por que nos levaram, Elvino? que falava de esperanças de madrugadas. Elvino que tinha o olhar de abraço de irmão. Elvino que tinha sempre o direito à defesa para qualquer um nós. Elvino que era humano e humanista para todos nós”, questionaram.
Advogados e juízes lamentam a perda de um íntegro defensor da justiça
A Ordem dos Advogados de Moçambique, entidade na qual estava profissionalmente inscrito, reconhece o esforço do causídico na promoção da advocacia nas zonas menos urbanizadas. Através disso Elvino queria asseverar que todas classes sociais tivessem as liberdades e direitos fundamentais garantidos.
“O nosso colega não entrou nesta luta pela defesa dos direitos e liberdades para obter ou defender interesses materiais, mas antes para defender os ideais da justiça e da verdade, tendo nesse exercício único deixado obra para a posteridade que ficou escrita nos anais da história deste país”, afirmou Carlos Martins, bastonário da OAM.
Jafete Fremo, Presidente da Associação Moçambicana de juízes disse que a sua intervenção como advogado foi sempre na defesa dos direitos fundamentais do cidadão, o que o tornou, num advogado interventivo que expunha as suas ideias de forma livre, espontânea e sem reservas.
Estes profissionais frisaram que ao longo da sua carreira, Elvino exerceu a profissão de advogado com integridade, sempre norteado por um firme compromisso com os mais elevados princípios éticos e de justiça.
“Calaram a voz de Elvino Dias. Todavia, a Associação Moçambicana dos Juízes não irá se calar, não irá se silenciar em relação a este assassinato, tal como não o fez em relação à morte do juiz Alberto Santos Nkutumula e sua esposa em 1992, da juíza Emília Simango em 1994, do juiz Diniz Sílica em 2014”, garantiu Fremo. (Ekibal Seda)