O referido cadáver foi encontrado em junho deste ano, por pescadores, numa zona em que frequentemente moradores daquele bairro dirigem-se para retirar diferentes espécies de peixe, para a sua alimentação, o qual é vendido naquela zona, também chamada de Tandavato e outros bairros próximos.
A referida região, onde parou o corpo, trata-se de um ambiente aquático no qual acontece a transição entre o rio e o mar. O fluxo de água doce encontra a salgada, e com a influência das marés o cadáver não se decompôs por completo mesmo após mais de 60 dias.
Para além disso a mesma água que inundou o corpo sem vida quando a maré ficava alta é a mesma que distribui-se pelo rio onde chega a atingir salinas próximas a região nas quais é produzido o sal de cozinha que também é comercializado naquela região.
Os denunciantes, que preferiram não se identificar, contam que o corpo foi descoberto numa manhã quando um dos pescadores dirigiu-se ao local para exercer as suas actividades quotidianas e surpreendeu-se com o malogrado. Assustado com a situação procurou informar as autoridades locais.
Depois de várias tentativas, de junho a esta parte, não tiveram sucesso. Devido ao medo decidiram não mover o corpo. Com o passar do tempo o cadáver foi se decompondo mas lentamente pois a zona em que foi abandonado é extremamente salgada.
A comunidade daquele bairro diz tratar-se de negligência por parte das autoridades pois estes estiveram no local, prometeram remover no dia seguinte mas não o fizeram.
“Até o próprio município, prometeu aproximar para ver o corpo e nos dias seguintes remover mas não apareceu. Essas promessas foram feitas num encontro que teve com pescadores”, denunciaram.
A comunidade conta que há alguns anos atrás foram encontrados restos mortais de desconhecidos com sinais de agressão. Depois de uma longa tentativa de identificar os corpos e procura dos respectivos familiares decidiram enterrá-los devido ao estado avançado de decomposição que já incomodava os moradores.
“Houve um caso aqui por volta de 2018, encontramos dois corpos de pessoas mortas também. Procurámos por seus familiares e não conseguimos encontrar até hoje. Os corpos já estavam podres e decidimos enterrar assim mesmo”, expuseram.
Este é mais um caso que não chegou de ser esclarecido pelas autoridades policiais. Os moradores lamentam a não remoção do mesmo pois das outras vezes os agentes colaboraram.
Moradores procuram explicação de como o cadáver terminou no local
Até ao momento da produção dessa reportagem moradores de Chinonanquila, em particular os pescadores, assustados, procuravam construir hipóteses para entender como o cadáver teria parado naquela zona.
Do que apuramos, como tentativa de explicar o caso, especula-se que o indivíduo tenha sido agredido até a morte e posteriormente os agressores teriam levado o malogrado a aquele local para se desfazer do cadáver.
Outra tentativa de esclarecer a situação, formulada pelos moradores, é que o corpo teria sido abandonado em um outro ponto e a força das águas teria empurrado o cadáver até Chinonanquila. Eles contam que isso já aconteceu.
“Duvidamos que também tenha morrido naquela época das chuvas em que tivemos cheias porque recuperamos muitos corpos de pessoas que não morreram aqui e entregamos as autoridades ”, disseram.
“Esse corpo foi boiando por aqui, quando soubemos que tinha um corpo reunimos para saber o que faríamos, quando fomos ver já não estava no mesmo lugar, as águas foram arrastando até parar aqui”, acrescentaram.
Conta-se que casos de cadáveres abandonados, que galgam as águas, aparecem de tempos em tempos nas margens do Umbelúzi, principalmente na zona do bairro Campoane e Bloco-II ainda no distrito de Boane.
“Já tivemos casos de pessoas que foram espancada aqui. Houve uma noite que vizinhos ouviram gritos de socorro e os agressores fugiram. Quando fomos ver a pessoa já estava morta. Trazem aqui para matar ou se desfazer do corpo”, lamentaram.
SERNIC diz não ter tido conhecimento e polícia fala de uma situação improvável
Apurados os factos a nossa reportagem procurou ouvir o Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) da Província de Maputo para entender os motivos da não remoção daquele cadáver volvidos aproximadamente três meses.
Depois de horas de contacto a Direcção Provincial do SERNIC disse não ter conhecimento do caso e negou a possibilidade de um corpo ter permanecido por tanto tempo sem ser removido.
“Nós o SERNIC não tivemos conhecimento disso e é estranho que isso aconteça. Como esse corpo aparece em tal sítio não temos como saber”, contou o porta-voz do SERNIC na província Da Maputo, Samussone Mahumane, prometendo aprofundar a investigação.
Procuramos igualmente ter o parecer da Polícia da República de Moçambique (PRM) ao nível provincial. Contactada a esquadra que responde por aquela região orientou-nos que procurássemos esclarecimentos no Comando Provincial.
Prosseguimos com os contacto por algumas horas com o Departamento de Relações Publicas do Comando Provincial da PRM na província de Maputo. Inicialmente negou-se a possibilidade da existência do caso depois de insistências é que admitiu-se o ocorrido.
Posto isso a PRM disse que nos últimos dias do mês de agosto tratou-se da remoção do corpo, facto que os moradores disseram não constituir verdade.
“O corpo foi removido na semana passada. Os pescadores e a comunidade fizeram diligências em um trabalho coordenado e conseguiram remover o corpo”, contou Rodrigues Tchabana Chefe de Relações Públicas do Comando Provincial da PRM em Maputo.
“O corpo não foi removido, abriu-se uma cova ao lado e tapamos com areia”, contam os pescadores contrariando a informação da polícia.
Ambientalista fala de risco eminente para saúde dos moradores
Apresentada a situação ao ambientalista Ervinio Litsure, especializado em ciências marinhas, explicou que pelo período de exposição do cadáver na zona de mangais, o seu processo de decomposição pode ter contaminado a água e os peixes, o que a longo prazo poderá trazer consequências a saúde dos moradores.
“Nesse período o corpo decompôs-se e liberou diversidade de produtos químicos e biológicos. O corpo humano é um hospedeiro de bactérias e vírus e isso pode ser partilhado no ecossistema. Os peixes podem ter consumido e isso pode trazer consequências a saúde”, referiu.
Segundo o ambientalista os peixes, alguns dos quais foram consumidos pela população ao longo desse período, podem ter contraído patógenos que podem ser prejudicais para a saúde pública.
Em relação a solução encontrada pela comunidade, a de enterrar o cadáver onde foi encontrado, Ervinio Litsure explica que isso pode vir agravar a situação.
“Existem possibilidades de cedo ou tarde termos risco de doenças infecciosas naquela zona para os banhistas e para as famílias que terão se alimentado por peixes que habitam no local. Para além disso o corpo poderá ser exposto com o passar de tempo”, avançou.
Diante disso recomenda que o cadáver seja destampado e retirado de forma imediata pois só assim o bem-estar da comunidade de Chinonanquila estará salvaguardada. (Ekibal Seda)