Nesses palcos, juízes e advogados, mesmo despidos de togas e becas, desempenham suas funções, embora aqui a missão seja de todos, o exercício das funções não exige carteiras, e ninguém se assume como réu, estamos todos do mesmo lado da lei.
Em nome de cultura, promove‐ se e publicita‐ se, espectáculos obscenos, que em nada enaltecem as nossas práticas. Nesses locais, vários são os eventos que em paralelo decorrem sob pretexto de um, e com as licenças, legitima‐ se a imoralidade e todos nos tornamos cúmplices. Com coreografias ensaiadas, cada caricatura com seus enfeites. Uns exibem charmes, trajes de marcas, as bailarinas exibem seus atributos extravagantes decorados.
Cada passo naquelas passarelas é minuciosamente trabalhado. Nenhuma peça é pendurada na montra ao acaso. São mannequins que atraem atenção, excelência no marketing. Quanto mais sedutoras, melhor. Não há frio, que lhes sirva de obstáculo na promoção do produto. Nem Lichinga, muito menos Chimoio ou Maputo são ameaças no inverno.
Se a mãe natureza lhe tiver sido madrasta, no traseiro, a globalização resolve, como tem sido com os cílios, os cabelos, as unhas, os peitos, até mesmo no nome, que não há bantu que lhe sirva de barreira.
Exibem suas curvas a um público ilustre, de um português afinado, que disfarça e, propositadamente, oculta as origens. Apesar de tudo, aqueles palcos parecem mais inclusivos que alguns ambientes, em que só os olhares dos colaboradores denunciam repulsa por gente desafortunada. É que nas casas de actuação daquelas miúdas os níveis académicos são sepultados logo nas entradas. A linguagem é outra, e o diploma de PhD confunde-se com o certificado de mérito do agente de uma dessas carteiras móveis. E é nas carteiras que a língua flui mais, não há gramática, sotaque, mau hálito ou trajes que superem a profundidade dos bolsos.
Todas as mesquinhices são relegadas ao plano secundário. Aqui o meritíssimo perde-se no rebolado, e a sentença é aplaudida sem se verificar o seu teor. Num único mundo coabitam os dois lados da lei, mas em ambos a imoralidade está estampada como figura de cartaz.
As exibições obedecem aos momentos, o DJ anuncia o menu, que às vezes há em que os pratos são de sabor estrangeiro. As perucas ou as famosas próteses penduram‐ se sobre as cabeças e os corpos arquitectónicamente concebidos, mas se amassam a preço de uma “pequena” bem gelada. São caçadoras noturnas, que usam seus atributos corporais para atrair olhares e mais algum para os seus egos.
Mas nem todas são assim, embora poucas, algumas ainda hidratam seus cérebros, frequentam ginásios para reforçar sua musculatura intelectual, meditam sobre conduta e mesmo assim seus passos são uma poesia andada. Na música ou cultivando a terra, outras ganham a vida da boca, sugando o óleo dos motores, outras há que desafiam alturas e “trepam” postes.
E há bairros onde convergem todos os tipos “de dança”. As de Mironga, na minha terra, são todas irmãs, mas a corrida pelo griff leva-lhes a estas incursões, onde o slogan “ninguém é de ninguém” impera. Em Namacula, todas se sentem da cidade, pior no meio de “gente que é gente”! As de Namicopo, hoje em dia exalam estrelismo, e exalam grandezas como as caricaturas de Albazine ou de Muhalaze, na presença de gente das “províncias”. As do pequeno Brasil, ainda tem esperança de reconhecimento, e pelo sotaque não se misturam, vivem num mundo paralelo à realidade da terra do samba.
Ainda cedo, algumas ganham a vida e constroem carreiras como dançarinas de polldance, subindo em “paus” de todos tamanhos. Tem repertórios com alcunhas como HIV, PRUDENCE, ROUND, WIDAS, DTS, só para citar alguns. Uma verdadeira afronta às sagradas escrituras “Acaso não sabem que o corpo de vocês é santuário do Espírito Santo que habita em vocês, que lhes foi dado por Deus, e que vocês não são de si mesmos? Vocês foram comprados por alto preço. Portanto, glorifiquem a Deus com o corpo de vocês.” 1 Coríntios 6: 19-20.
Romantizam extorsão e pedofilia. Exigem dos outros degraus acima dos seus e emocionam‐ se por viaturas que só lhes pertencem na ilusão, deleitam‐ se em troca do vazio e iphones que em suas mãos não passam de enfeites.
Nunca sonolenta nos palcos mundanos, mas sonâmbula na igreja, onde apenas precisa cumprir o papel social de filha, sobrinha ou mesmo enteada do pastor. Canta louvores no altar, diante dos irmãos em cristo e da noite. A imoralidade se instala e domina, a “igreja” finge demência sobre o carácter dos corpos ambulantes para si transladados. Ninguém se atreve a julgá‐ la, nem o pastor, que vive refém dos apetites carnais das irmãs da congregação.
É um mundo que normaliza as futilidades dessa terra, é um mundo legitimado pelas autoridades e chancelado pela globalização. É dos ateus, dos fiés, dos analfabetos, mas é também dos intelectuais, e todos nós somos parte dele, entretanto, é um mundo que nenhuma cegueira nos limita a VER.
(Leonel A. Mucavele)