A propósito, o médico cirurgião e urologista Igor Vaz mostrou-se preocupado pelo facto de algumas doentes depois de tratadas não observarem as recomendações médicas, o que depois lhes causa complicações.
“Temos casos de doentes com cirurgias mais simples que não deviam recidivar, mas recidivam. Pode ser por má técnica do cirurgião, que não está habilitado ou não tomou atenção necessária ou não têm formação suficiente para resolver aqueles casos. Mas também temos aqueles casos em que o cirurgião fez tudo o que era possível e ficou tudo bem, mas depois a doente não cumpriu com as normas de pós-operatório. Muitas vezes, por razões económicas estas doentes são obrigadas a ir tratar da vida delas, não têm apoio da família e depois de 2, 3 ou 4 horas de cirurgia fica tudo estragado porque ela foi ao mercado. Outro ponto é que por vezes os maridos não respeitam o período de 3 meses em que as mulheres não podem ter a actividade sexual e eles obrigam a mulher a ter actividade sexual e estragam a cirurgia toda”, disse.
Apesar do tratamento ser gratuito, o cirurgião diz que as cirurgias de fístula são caras e por isso as pacientes e familiares devem respeitar os cuidados pós-operatórios.
“A cirurgia é gratuita para as pacientes, mas os custos são suportados pelo Ministério da Saúde e pela Focus Fístula. O MISAU disponibiliza por exemplo a unidade sanitária com cirurgiões, anestesistas, instrumentistas, salas de operações, salas de recobro, enfermaria, enfermeiros, é uma equipa muito grande que depois vai tudo por água abaixo. A operação de fístula complexa pode custar 500 mil meticais. A doente não paga nada, mas tem custos que o Governo e parceiros suportam. É preciso dar valor a este esforço. Para haver sucesso não depende só dos médicos. Depende também da paciente e dos familiares da doente que deve dar todo apoio durante o período da recuperação” disse o médico, que também é director geral da Focus Fístula Moçambique.
Chica T., 26 anos, natural de Marromeu é uma das pacientes que recebeu tratamento em abril do presente ano, mas que agora voltou para o Hospital Central da Beira porque teve complicações depois da cirurgia.
“Fui operada pela primeira vez em 2018 e não deu certo. Voltei em abril deste ano para fazer outra cirurgia e quando saí do hospital estava bem. Sou que quando comia ou bebia água eu lançava e por causa deste movimento acabou se abrindo de novo e por isso estou aqui”, disse.
Chica diz que foi abandonada pelo marido logo depois de ter dado o parto e contraído a fístula.
“O meu marido me abandonou em 2017. Disse que não queria mais por causa da doença. Eu perdi a criança durante o parto. Fico triste com esta situação. Não consigo ficar perto das pessoas. Mesmo no chapa (transporte) quando subo as pessoas ficam a falar que está a cheirar xixi. Quando vou para a igreja nunca termino o culto, só fico 30 minutos e depois vou embora para casa para as pessoas não reclamarem”, disse, tendo acrescentado.
Segundo a directora de serviços da Cirurgia I no HCB, médica cirurgiã Zélia Cristina o número de doentes com fístula tende a aumentar na província.
“Temos muitas mulheres com problemas de fístula ao nível dos distritos da província de Sofala e da cidade da Beira. O número de doentes com fístula tende a aumentar e o nosso objectivo com estas cirurgias é de reduzir o sofrimento destas mulheres. Praticamente todos os distritos da província de Sofala estão envolvidos nesta campanha, Nhamatanda, Buzi, Caia, enfim, todos os distritos. Temos 3 salas e por dia em cada sala fazemos 5 cirurgias. Alguns casos são mais complicados, mas esta é nossa média para conseguirmos operar o máximo possível”.
As sessões de cirurgia estão a decorrer no Bloco Operatório Hospital Central da Beira (HCB), conta com médicos nacionais entre cirurgiões, urologistas, anestesistas, técnicos de cirurgia, técnicos de saúde, enfermeiros e entre outros.
Fístula obstétrica é uma abertura anormal entre o trato genital da mulher e seu trato urinário ou recto, causado por trabalho de parto arrastado e obstruído sem acesso a cuidados médicos imediatos e de qualidade. A fístula obstétrica pode ser prevenida, através do acesso a cuidados obstétricos de emergência, e acompanhamento pré-natal e de parto seguro.
Em Moçambique, estima-se que cerca de dois mil e quinhentos novos casos de fístula obstétrica são registados anualmente.