Por: Bendito Nascimento
Primeiramente, é crucial questionar a sinceridade dos compromissos assumidos por Ruanda e RDC. Historicamente, ambos os países têm utilizado a retórica de paz enquanto perseguem agendas militares e políticas próprias. A desconfiança entre os dois países está enraizada em décadas de conflitos e intervenções mútuas. A RDC acusando o Ruanda de apoiar o grupo rebelde M23, enquanto Ruanda acusa a RDC de abrigar as Forças Democráticas para a Libertação de Ruanda (FDLR), compostas em parte por elementos envolvidos no genocídio de 1994. Quais garantias existem de que desta vez será diferente? E uma negociação sobre o M-23 e sem envolver o M-23 será funcional?, visto que para além de cumprirem agenda de Ruanda, também têm agenda própria. A liderança de Angola, embora bem-intencionada, pode não ser suficiente para assegurar a implementação de mudanças significativas. Pois, embora respeitada, enfrenta seus próprios desafios internos que podem limitar sua capacidade de manter pressão contínua sobre Ruanda e RDC.
Além disso, a presença de grupos armados na RDC não é apenas uma questão de desmobilização técnica, mas está profundamente enraizada em questões socioeconómicas e políticas locais. A região leste da RDC, rica em recursos naturais, tem sido um campo de batalha para diversos grupos armados que financiam suas actividades através da exploração ilegal desses recursos. Portanto, como esses grupos serão efectivamente desarmados e reintegrados em uma sociedade que continua a ser marcada por pobreza extrema, corrupção e governança frágil? Será que o M-23 vai abandonar os recursos daquela região? A troco de o que? Kagame vai abandonar os recursos do leste de Ruanda a troco de o que?
Além disso, a implicação geopolítica deste acordo não pode ser ignorada. A estabilidade da região dos Grandes Lagos é de interesse estratégico para diversas potências externas, incluindo China e Estados Unidos. Como essas potências reagirão ao acordo (por debaixo dos panos)? Existe o risco de que o envolvimento externo possa complicar ainda mais a situação, ou estas potências podem desempenhar um papel construtivo na implementação do acordo? A presença de recursos naturais valiosos na região, como minerais raros, adiciona outra camada de complexidade, tornando qualquer acordo susceptível a influências e pressões externas. Como será possível equilibrar os interesses regionais e internacionais para garantir uma paz sustentável?
A implementação efectiva do acordo entre Ruanda e RDC exigirá não apenas vontade política, mas também uma mobilização de recursos financeiros e técnicos substanciais. Quem financiará essas iniciativas para a suposta integração dos homens do M-23 junto da sociedade? A RDC e Ruanda têm capacidade financeira para sustentar as operações de desmobilização e reintegração, ou dependerão de ajuda externa? Se dependerem, quais serão as condições impostas pelos doadores internacionais, e como isso afectará a soberania e a dinâmica interna dos países envolvidos? A comunidade internacional, particularmente organizações como a União Africana e as Nações Unidas, terão um papel crucial em monitorar e apoiar a implementação do acordo. No entanto, sua eficácia dependerá de um equilíbrio delicado entre apoio e respeito pela soberania dos países envolvidos.
Contudo, as respostas a essas perguntas determinará o futuro de milhares de pessoas que vivem na sombra deste conflito prolongado no leste da RDC.