O alerta era grave: um comboio de carvão tinha descarrilado nos arredores de Murissa, Distrito de Cuamba, na Província de Nissa. Ao longo da zona do sinistro encontrava-se também uma ponte, onde jovens brincavam no riacho e onde alguns vagões havia tombando. Os primeiros relatos indicavam fatalidades e a contaminação do ambiente local pelo carvão disperso. Foi ao cair da tarde, não havia nenhum aeroporto próximo e embora as equipas de socorro estivessem já a caminho era evidente que enfrentaríamos horas críticas até obter dados concretos e poder agir eficazmente.
O que se seguiu for a execução coreografada vezes sem conta sobre como agir nestas circunstâncias; o foco no resgate, a evacuação e salvamento de vítimas, apoio material e psicológico às famílias, contenção de risco ambiental, notificação imediata às diversas autoridades competentes, e um hercúleo exercício de comunicação.
Os detalhes são inúmeros e complexos, mas queria apenas partilhar o que considero serem os quatro pilares de gestão de crise que ajudam a salvar vidas e a reputação de uma empresa:
- Assumir rapidamente o estado de crise (não tapar o sol com a peneira): A situação exigia um reconhecimento imediato e ações decisivas, sem tentativas de minimizar a gravidade dos fatos. Reconhecer a crise abertamente ajudo a mobilizar todos os recursos necessários sem delongas.
- Liderança ativa e responsável (dar a cara): O líder deve assumir a frente da operação, coordenando as ações dos seus liderados nas áreas competentes, e garantindo que as ações necessárias sejam implementadas sem hesitação. Esta postura não apenas acelera a resposta como fortalece a confiança entre os stakeholders envolvidos.
- Comunicar sem cessar: Não se pode deixar gerar narrativas alternativas, sobretudo devido à propagação que pode ser gerada (e às vezes viralizada) pelas redes sociais. Não obstante as implicações legais, é importante que haja um canal de comunicação aberto e disponível que passe informação fidedigna (mesmo que por vezes preliminar) sobre a evolução da crise.
- Uma resposta forte e abrangente e até desproporcional: Em momentos de crise, a resposta precisa ser intensa e abrangente, e nunca se peca por excesso. Seja no apoio às vítimas, na gestão ambiental, na apuração das causas, na correção do erro e/ou para e evitar reincidência quaisquer medidas transparentes adotadas numa crise raramente são consideradas excessivas.
Os líderes que normalmente não sobrevivem a este tipo de episódios ignoraram pelo menos dois destes pilares.
Para mim, o mais marcante deste episódio foi agir sobre o 4º pilar, inconformado com um diagnóstico médico derrotista contrariei vários protocolos para que dois meninos pudessem ter os seus documentos emitidos e fossem evacuados para a África do Sul, onde vieram a recuperar plenamente. Poderia ter perdido o emprego na segunda-feira, mas felizmente para mim (e para os meninos), algumas das nossas mais altas instâncias também estiveram à altura dos seus cargos.
Estaremos sempre à mercê da próxima crise; seja um comboio descarrilado, um avião que fica sem a porta em pleno voo (o caso da Boeing), ou um navio cargueiro que faz tombar uma ponte (o caso de Baltimore), a realidade é sempre assustadora que a ficção.
Embora tenhamos conseguido salvar vidas, outras perderam-se, os danos foram significativos e as lições aprendidas são inestimáveis. Devemos estar sempre prontos para melhorar nossas práticas e garantir que a segurança e a eficácia estejam no coração de nossa atuação.
Quer fazer tudo para evitar e estar pronto(a) para a próxima crise? Venha falar connosco.
*Bruno Chicalia é consultor empresarial, sócio da CTJ Consultoria Moçambique.