Uma nota publicada pelo Centro de Aprendizagem e Capacitação da Sociedade Civil (CESC) indica que para o ano lectivo de 2024, o Governo encomendou 21.043.900 livros de 1ª à 6ª classe, dos quais 19.722.500 são de ensino monolingue (em uma língua), 604.150 são do ensino bilingue, 5.250 escritos em braille (para crianças com necessidades especiais), 422.700 são destinados à alfabetização de adultos e 289.300 são manuais e guiões de professores para facilitar o processo de lecionação.
Há duas semanas, o Governo disse, na Assembleia da República, que os livros escolares da 1ª, 2ª e 3ª classes já tinham chegado aos portos de Maputo, Beira e Nacala, e a sua distribuição pelos Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia havia iniciado. Por outras palavras, o Governo foi ao Parlamento confirmar que o livro escolar de distribuição gratuita ainda não tinha chegado às mãos das crianças que frequentam o ensino primário do SNE, quando faltavam menos de duas semanas para o término do primeiro trimestre.
Mais grave ainda é que os livros que estão a ser transportados dos portos (Maputo, Beira e Nacala) para os Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia não são de todas as classes do ensino primário, mas apenas da 1ª, 2ª e 3ª classes. Não se sabe quando é que os livros da 4ª, 5ª 6ª classes irão chegar a Moçambique, situação que aumenta os receios de as crianças que frequentam essas classes passarem o segundo trimestre sem aquele instrumento essencial na construção do saber científico e cultural.
A chegada tardia do livro escolar às mãos das crianças também se verificou no último ano lectivo. Até Agosto de 2023, o Governo ainda tinha por alocar um total de 1.617.863 livros aos Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia das províncias do Niassa e Cabo Delgado. Isto é, dos 13.892.900 livros planificados, tinham sido alocados aos distritos 12.274.497 livros, correspondente a uma execução de 93%.
Se até Agosto de 2023 ainda decorria o transporte do livro escolar de Nacala para os distritos de Niassa e Cabo Delgado, significa que há crianças que entraram para o terceiro e último trimestre do ano lectivo sem o livro escolar de distribuição gratuita.
“Enquanto o livro escolar não for colocado nas escolas em tempo útil, a qualidade do ensino fica comprometida, pois o livro é essencial no processo de ensino e aprendizagem. A chegada tardia do livro nas escolas compromete igualmente a plena efectivação do direito à educação, consagrado no artigo 88 da Constituição da República de Moçambique, incluindo o princípio de acesso universal à educação gratuita e de boa qualidade”, lê-se na nota do CESC.
Serviços Distritais de Educação não tem orçamento para fazer chegar o livro às escolas
O processo de distribuição do livro obedece a um esquema em que o Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH) é responsável por alocar o livro até aos Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia, cabendo a estes serviços fazer chegar o livro às escolas. Nas capitais provinciais, onde há facilidades de circulação, o livro é distribuído até às escolas pelo MINEDH.
Sucede que os Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia, que têm a missão de fazer chegar o livro às escolas, muitas delas localizadas em zonas de difícil acesso, não dispõem de orçamento suficiente para fazer a distribuição do livro escolar. Por isso, os livros que já chegam tarde nos Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia – normalmente no fim do primeiro trimestre, levam mais tempo ainda para chegar às escolas, sobretudo aquelas que estão mais distantes das sedes distritais e /ou em locais de difícil acesso.
As crianças que frequentam as escolas localizadas em zonas rurais de difícil acesso acabam sendo as mais penalizadas, sendo que muitas chegam a entrar para o terceiro e último trimestre sem o livro escolar, como se verificou no ano lectivo de 2023 em algumas escolas de Niassa e Cabo Delgado.
Enquanto o livro não chega para todas as crianças que estão no ensino público, a Inspeção Nacional das Actividades Económicas (INAE) detectou, em todo o País, 224 escolas privadas que usavam o livro escolar de distribuição gratuita. Esta situação revela que, além dos problemas na cadeia de produção e distribuição do livro escolar, o MINEDH enfrenta o desvio de manuais para as escolas privadas.
Por isso, o CESC defende a alocação directa de meios financeiros às Direcções Provinciais de Educação e aos Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia para a distribuição do livro às escolas, bem como a descentralização da contratação de empresas que transportam o livro escolar dos portos para os Serviços Distritais de Educação, Juventude e Tecnologia (neste momento as empresas são contratadas a nível central).
A observância rigorosa de todas as etapas de provisão do livro escolar, desde a edição até à distribuição, com envolvimento activo de todos os actores relevantes (Governo central, provincial e distrital) é outra medida defendida pelo CESC para garantir que o livro chegue em tempo útil e em quantidade e qualidade desejada.
Para combater o desvio de livro escolar de distribuição gratuita, a organização apela à introdução de medidas concretas de segurança nos locais de armazenamento e em toda a cadeia de distribuição. “É preciso incluir no calendário do ano lectivo o período de distribuição do livro escolar de modo a evitar que as aulas iniciem sem que as crianças tenham recebido a material”.