A FORMA COMO SE VENDE A ACADEMIA E O PROFISSIONALISMO PELA GANÂNCIA PODE SUSCITAR PERIGO CAPAZ DE CUSTAR A VIDA DA SOCIEDADE

Escrito por: Zacarias Nguenha

Quando eu estava a frequentar o meu primeiro curso de formação de professores, assisti e vivi várias situações, boas e más, mas que finalmente tornaram-me o que hoje sou. Uns desses factos foram os desafios para com o próprio curso: formar-se para ser um professor, e a vida do internato: acordar 4h30 e a quantidade e o tipo de comida. Mas, como disse, foram, felizmente, alguns elementos que contribuiram bastante para a minha própria ideia sobre o que é, de facto, crescer física e intelectualmente.

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Por exemplo, quando entramos no internato, nos primeiros dias, alguns colegas (principalmente as mulheres) não comiam a comida que lá se preparava, optavam por comprar nas barracas próximas ou montar umas cozinhas fora do lar ou ainda dentro (em ‘boladas’ com cozinheiros), ou se tomassem refeições connosco, o faziam acompanhadas de sumos, pães e outras coisinhas, para enriquecer os pratos de “meia-lua” de xima com feijão e molho de se nadar ou de papa de farinha de milho durante o matabicho.

Vários episódios aconteceram. Até aos primeiros 90 dias, quase ninguém mais preparava nem o almoço, nem o jantar, e muito menos o matabicho privado, talvez pelo imperativo do internato que foi sendo mais rigoroso, ou talvez pela socialização em relação ao novo ambiente, ou ainda pela exiguidade de moedas pelo aumento de despesas de cópias e transporte às escolas de praticas pedagógicas, e apartir daquele período, para poder se saciar, ou deveria ser-se um dos chefes de qualquer coisa, ou ser-se amigo dum dos chefes, ou ainda amigo do amigo dum deles, ou então, deveria criar-se qualquer táctica para binar os pratos ou simular-se uma situação de enganar o guarda, ou mesmo ter-se amizade com ele, para se comprar bolinhos que se vendiam arredores do murro do instituto.

Naquela luta de sobrevivência no internato, bom também era ser conhecido como “binador”, enquanto outros se escondiam, ou como inteligente (que não negasse com as respostas perante os colegas durante qualquer prova), para que qualquer mana que tivesse tomado a refeição com o namorado ou de qualquer jeito durante as praticas, chamasse-te e poder te entregar o seu prato recebido, às vezes em troca de rega no seu canteiro de couve ou ainda pelo bom coração, até que a situação piorasse e chegasse o dia em que se perdesse o controlo e quase todos assumissem não apenas como simples binadores, mas também, como vândalos.

a verdade, no dia 28 de Agosto de 2012, assistí o maior golpe de copa que nunca imaginaria que poderia acontecer numa instituição de formação de professores (futuros espelhos da sociedade). Fora aqueles pequenos factos de alguem queimar-se com papa enquanto estivesse a meter ou tirar a mão da panela à força, naquele dia os formandos invadiram a copa e carregaram consigo todas as panelas de xima e feijão até junto à machamba de praticas de Noções Básicas de Construção e Manutenção Escolar, uma distância de cerca de 500 metros do refeitório, donde se comeu (para quem tivesse força de empurrar os demais) e posterior abandono dessas panelas, até que os cozinheiros recolhessem-as. E a formação continuou, por que estou a contar essa história?

Tal e qual numa casa onde o pai é bêbado e a mãe vadia, sem mais ideia de nada sobre a família, com o risco de os seus filhos serem ladrões e prostitutas, a fragilidade duma sociedade movida pela corrupção gananciosa e abuso de regalias a olho nu, que suscita dúvidas e afirmações irónicas como “este país é qual?”, “dê-me chaves deste país, quero sair”, “este país já bazou”…como tem-se assistido nas redes sociais, por exemplo, com paralelos preocupantes de “quem sou eu para não fazer coisa x?”, pode levar o barco a não chegar no alto mar, nem ao menos voltar à praia.

Algumas situações que estão acontecendo na nossa sociedade podem trazer um perigo para connosco mesmo.

Na semana passada, eu estava num chapa e assisti(mos) uma situação triste, embora já com tendências de se confundir com a norma, uma policia municipal tirando nota do livrete do motorista dum minibus que estava doutra margem da estrada donde nos encontrávamos, sem nem receio de nada, tranquila e serena, como quem sabe, de facto, que nada pode lhe acontecer. E alguém pode tentar negar isto, mas sei que sabe que todo o mundo sabe que está acontecendo.

Pensar que quando o motorista é corrompido pela policia na estrada quem sai a perder é o patrão (proprietário do carro), é um equivoco. Os passageiros pagam este preço nas bagagens, viajando tais escravos (cobrador por cima de passageiros), nos aumentos ridículos de tarifas (quero acreditar que, embora não se diga, as associações contam também com isto).

Outra situação é essa de professora ter supostamente tentando sequestrar a sua própria aluna em troca de 500 mil meticais, na Escola Primária 1 de Junho, Sussundenga. É muito triste e preocupante. Se nós os professores somos segundos pais, e ainda tentamos a vida de nossos alunos pela ganância (assim posso dizer), a quem mais confiará o povo?

O povo já habituou e suporta cobranças exorbitantes de brochuras e avaliações constantes, de baixa qualidade de ensino, fora tantas situações que vão de encontro com a paz, e ainda quer tirar-se suas vidas?

Quer dizer, como dizia um amigo, já é o momento de invadir o País? Cada um entende e faz o que bem o convier para o seu bem? Já não há mais regras nesta pátria chamada Moçambique?

Isso não é bom!

Os ditos académicos são outro grupo que eu em particular duvido muito de sua intelectualidade. Parece-me que muitos desses só estudaram para usar das suas a fim de enganar os menos conhecedores de como as coisas funcionam. E a esses também pergunto: afinal, todo aquele sacrifício desde 1ª classe, era para isso? E têm orgulho?

Enfim, no fim do dia teremos mais perguntas e menos respostas, como quem dizia que formamos mais sociólogos, historiadores, juristas e poucos engenheiros agrónomos, por exemplo, ou melhor, formamos gente que fala e que nada faz, e para não se aplicar esta posição no presente artigo, termino dizendo que a academia deve ser o instrumento norteador de actuação policial, de professores,…até da nossa própria política.

Há dias quase abandonei uma sessão por alguém ter ousado em juntar conscientemente discurso político, ainda muito off, num forum de academia, fiquei conformado quando um dos oradores teceu umas abordagens apagando aquela confusão anti-intelectual.

O mais preocupante ainda é assumirmos os moldes actuais da nossa politica (com tendências partidárias e sobretudo muito subjectivas) serem o fárol para a academia com normalidade. É perigoso!